UMA FOTO ANTIGA

 

 

O coração estava apertado depois de uma noite mal dormida, me levantei lentamente e fui até a sala, lá estavam sobre a mesa um copo e duas garrafas vazias de vinho, um prato ainda com resíduos de petiscos e a vitrola ligada, tocava uma música antiga que me trouxe reminiscências. Ia desligar mas deixei tocar a música, dela me agradei. Dei início às atividades normais de quem é solitário e acorda tarde depois de uma noite bebericando. Um bom banho matinal, um café quente que eu mesmo preparo e algumas torradas com queijo manteiga. Uma fatia de bolo de milho e uma janela aberta para apreciar a paisagem. Olhei o relógio de parede na sala, quase nove. É sábado, nada para fazer, pelo menos por enquando, nenhuma programação em vista.

 

A manhã estava passando e uma tristeza repentina resolveu me visitar. Tentei expulsá-la, mas não sabia como. Já no quarto algo me levou ao guarda-roupa e minha mão pegou sem eu esperar um álbum de fotografias. A tristeza foi embora e entrou uma alegria instantânea. Abri o álbum e comecei a folhear. Várias fotos, coloridas, em preto e branco, algumas desgastadas pelo tempo. Atentei para uma já um pouco apagada em razão dos anos ali quase colada no plástico que a envolvia. Retirei-a com cuidado. Uma vontade de chorar invadiu meu peito, mas me contive, não seria necessário derramar lágrimas nesse momento, já me acostumei com a solidão e nada vai mudar minha vida, nem que as lembranças que povoam minha mente se tornassem realidade. A foto em questão é de Ruth, a mulher que tentou me amar e me ensinar a viver a vida da forma perfeita e feliz. Mas eu não lhe dei atencão, preferi a vida agitada das noites e madrugadas em bares e inferninhos da zona boêmia da cidade. E quando eu chegava em casa ela estava a me esperar como se nada de errado estivesse acontecido, como se eu chegasse do trabalho para jantar com ela. Anos e anos nessa vida de ingratidão deixou Ruth triste e desencorajada para continuar me ajudando até que a doença a enfraqueceu e a levou a morte. O arrependimento bateu forte depois que pus a mão na consciência, mas era tarde demais. O meu consolo agora é tomar meus vinhos em minha própria casa, começando pela noite e entrando pela madrugada, tento esquecer tudo, mas é impossível.

 

 

 

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 11/05/2023
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