"O PEDIDO"

O PEDIDO.

Era algo próximo de uma e meia da tarde de domingo, no calendário podia se observar, vinte e um de dezembro de 1969. Dinho como era conhecido, apelido de Frederico que passou a ser chamado Fredinho, e acabou simplificado apenas Dinho.

Caminhando por uma estrada de terra, já era possível enxergar a casa do senhor Belmont. Toda segurança, ajuntada no decorrer da semana, quando deixou acertado com Doralice e sua mãe, à visita para pedir a moça Doralice em namoro, para seu pai o senhor Belmont. Nesse instante dá lugar para mãos suadas e leve dor de barriga.

Ainda mais porque já se podia ver o senhor Belmont , assentado na área da casa. O que lhe trouxe pouca, bem pouca tranquilidade foi ver Doralice, que estava em pé na porta de entrada da casa. E já o avistara, fazendo menção em vir recebê-lo. Ação que empreende.

Por alguns momentos, todo desconforto do presente instante, como que por encanto desaparece. Reflexo do sorriso e do encanto de Doralice, olhos negros como noite sem luar, pele trigueira, longos cabelos pretos. Uma verdadeira visão, de encher olhares apaixonados.

Diante deste cenário, Dinho respira fundo e segue à passos firmes (não tão firmes assim). Doralice adianta-se e posiciona-se em pé, no lado de fora do portão de entrada para recebê-lo. O senhor Belmont permanecia sentado, exalando um certo ar de indiferença, como se estivessem alheio a tudo e a todos ao seu redor. Panorama que acaba por fomentar pouco mais de insegurança, no já temeroso Dinho.

Eis que alcança Doralice, que o cumprimenta com um leve aperto de mãos, o convidando a adentrar. Mesmo diante da emoção, em estar próximo à Doralice, não lhe era possível sentir-se apaziguado. Pois olhando de soslaio, pode ver o senhor Belmont, assentado na cadeira da área, olhando na direção oposta, como se olhasse para o nada. Que no caso, tinha à sua frente um capão de erva-mate. Quando Doralice chama-lhe à atenção, falando-lhe em tom baixo.

- Eu já falei com papai, que você viria hoje para conversar com ele.

Recebendo a concordância por parte de Dinho, que estava ciente, chama a atenção do senhor Belmont, para contar da presença de Dinho.

-Papai, o Dinho está aqui para falar com o senhor.

Nesse momento o senhor Belmont, vai voltando o rosto lentamente na direção dos dois jovens ali parados. Antes de pronunciar qualquer palavra o pai de Doralice, levanta-se lentamente, segura a cadeira pelos apoios de braço, levantando-a e mudando sua posição, onde está agora de frente para Doralice e Dinho. E com voz grave fala.

- Filha, vai até a cozinha e traz uma cadeira.

Doralice respondeu sim senhor, e dirigiu-se à cozinha, dar ordem ao pedido do pai. Sua ausência durou alguns segundos apenas, mas o suficiente para que o silêncio instalado, parecesse eterno. Quebrado pelo retorno de Doralice.

- Mais alguma coisa papai?

Que respondeu o senhor Belmont.

- Não, só isso mesmo, pode ir ajudar sua mãe nos afazeres. Se precisar de você eu chamo.

- Tá bom papai, com licença.

Disse isso e retirou-se. Então o senhor Belmont, falou.

- Muito bem senhor Dinho, assente-se.

Dinho seguindo a solicitação do pai de Doralice tomou assento. E outra vez dispõe o senhor Belmont.

- Muito bem meu rapaz, o que têm você para me dizer?

Indagou com olhar inquirido. Onde Dinho respira fundo e responde, mesmo com a voz pouco titubeante, por conta da boca seca.

- Imagino que Doralice e a senhora sua esposa, devam ter lhe participado sobre o motivo da minha visita. Já se vai um tempinho em que trocávamos olhares eu mais Doralice antes e após a missa dos domingos. Foi então que a dois domingos passados, trocamos algumas palavras, Doralice e eu, sobre a supervisão da sua esposa. Onde expus minhas intenções, em conhecê-la melhor, pois estava encantado com o seu jeito.

O pai de Doralice permanecia estático, olhar fixo na direção de Dinho. Que segue seu discurso.

- Onde Doralice e sua esposa, disseram-me que isso carecia do seu consentimento. Assim no domingo passado, falei da minha vontade em vir conversar com o senhor, sobre minhas intenções junto à Doralice. E obter sua permissão para namoro. Hoje pela manhã após a missa, sua esposa me comunicou que eu poderia vir à tarde, para falar com o senhor.

Dinho imaginando já ter falado o suficiente, faz breve pausa, como buscar qualquer movimento por parte do pai de Doralice. Que dispõe.

- Qual suas reais intenções com minha filha?

Diante da indagação curta e seca, Dinho outra vez busca o ar profundamente e responde.

- Como lhe falei senhor Belmont, esse meu pedido de namoro é justamente para nos conhecermos melhor, e se nós se combinar, minha intenção é casar com Doralice.

Outra vez Dinho pausa seu discurso, para que o pai de Doralice se manifestasse. Onde este retoma à fala.

- O senhor está com quantos anos, Dinho?

Quando Dinho responde.

- Acabei de fazer dezenove anos, no último dia 10.

Novamente Dinho silencia, para que o senhor Belmont se manifeste.

- Eu senhor está trabalhando, estudando o que tem feito da vida?

- Atualmente estou trabalhando de conferente na fábrica de erva-mate, não estou estudando atualmente, mas já concluí o Científico. Verdade que tenho desejo em continuar meus estudos, fazer uma graduação, mas está um pouco custoso no momento, pois teria que me mudar para a capital ou para Ponta Grossa, são as cidades onde tem universidade.

O pai de Doralice que ouvia tudo atentamente, retoma à fala.

- ,Muito bem, eu conheço seu pai, sei que você é de boa família, vejo que Doralice já está em tempo de casar, vai fazer dezesseis anos. Quando casei a mãe dela, tinha quatorze. E Doralice é muito prendada, lava, passa, sabe cozinhar, faz crochê, bordado, costura e muito caprichosa. ⁸Estudou até o oitavo ano, acho que já é mais que suficiente.

Nesse momento foi o pai de Doralice que cessou seu discurso, como a buscar qualquer fala por parte de Dinho. Que diz.

- É muito claro que Doralice é uma moça muito bem orientada.

Dessa vez foi Dinho que foi curto na disposição. Dando espaço para o senhor Belmont seguir sua oratória.

- Penso que estamos nos entendendo, basta saber se a pessoa mais interessada está de acordo.

O senhor Belmont disse isso e chamou Doralice.

- Doralice, venha cá minha filha.

Onde Doralice em segundos chega para atender o chamado do pai.

- Minha filha Dinho me falou das intenções dele em namoro contigo. Também é da sua vontade namorar com ele?

Onde Doralice responde

- Sim meu pai.

Sendo assim eu permito. Mas namoro só no domingo, aqui em casa. Para saírem juntos somente com alguém acompanhando. Não é desconfiança, mas o seguro morreu de velho. Estamos entendidos?

Ouvindo o aceite de Doralice e Dinho. Fala novamente.

- Minha filha, preciso conversar mais umas coisas aqui com o senhor Dinho, de homem para homem. Vai até a cozinha e me traz uma volta de chouriço e uma garrafa de pinga com dois copos.

Nesse momento Dinho sentiu a adrenalina baixando um pouco. Pois embora ainda ecoasse em seus ouvidos, a frase conversa de homem para homem, uma conversa com chouriço e uma branquinha, tende à ser pouco mais leve à princípio. Então outra vez o pai de Doralice dispõe.

- E casa pra morarem, se virem a casar um dia, o senhor tem?

Outra vez Dinho foi interrogado com um tom pouco cordial. E responde.

- Casa ainda não tenho, não senhor. Mas fui presenteado com um terreno, pelo meu pai, próximo a onde moramos. E tenho a intenção em construir uma casa lá. Até já estou adquirindo materiais de acabamento, já que a madeira meu pai disse que posso derrubar uns pinheiros que ele tem na chácara. Diria que já está bem encaminhado essa situação.

Dito isso, Dinho fez silêncio, a permitir qualquer colocação, por parte do senhor Belmont. Que se pronunciou.

- Se está nesse pé, pendo que está encaminhada. Porque quem casa precisa de casa.

O pai de Doralice cessou o discurso, no mesmo instante em que a moça retorna com o pedido do pai. Traz também uma pequena mesa, tipo de centro e coloca o prato com o chouriço, talheres, a pinga e os copos. Por um instante, Doralice permaneceu parada, como à aguardar qualquer orientação do seu pai. Que fala.

- Pode ir minha filha, se precisar eu te chamo.

A moça pede licença e desaparece na direção da cozinha.

- Pois bem Dinho, vamos beliscando esse chouriço e tomando uns tragos, enquanto conversamos. Fico contente com sua determinação e vontade de crescer, entendendo que bens materiais pode não ser o mais importante em um casamento, tanto que os dois se gostarem e olharem na mesma direção. Mas dificuldades materiais, pode trazer atritos e isso nunca é bom.

O pai de Doralice fez pausa, como a permitir qualquer manifestação por parte de Dinho. Que falou.

- Concordo plenamente com o senhor, senhor Belmont. Sei das condições que o senhor, dispõe para sua família. Jamais desejaria casar com Doralice, para passarmos dificuldades. Claro que todo início, tende a surgir alguns imprevistos, muito por conta da normal inexperiência, no início do casamento. Mas nada que não possa ser contornado, no dia a dia da convivência.

Dinho já sentia-se bem mais relaxado e falante, muito por conta já do segundo fundo grosso de pinga. Fez uma pausa no discurso, aproveitando para servir-se de mais um pedaço de chouriço. Que inclusive estava suculento, tempero intenso, onde o sabor apimentado casava perfeitamente, com a branquinha. O senhor Belmont, outra vez se manifesta.

- Não quero que o senhor tome o que vou dizer como um passe livre, para excessos de liberdade. Mas fico contente que você é Doralice namorem. Espero que não me decepcione.

Falou isso e deixou espaço, para qualquer fala de Dinho. Que discorre.

- Fico contente com isso senhor Belmont, e prometo fazer o melhor, para que essa empresa seja exitosa.

E assim às conversas foram fluindo, cada vez mais leves. O senhor Belmont, contando da rotina do sítio, onde se produziam muitas coisas. Inclusive o chouriço que estavam comendo e a cachaça que estavam bebendo. Além de contar com um lote considerável de pés de erva-mate. Que em tempo de poda, era vendida para a mesma fábrica de processamento onde Dinho trabalhava.

Quando as conversas são interrompidas por Doralice que chega junto à área, contando sobre sua mãe pedir para chamá-los para tomar café. Onde o senhor Belmont responde.

- Diga pra sua mãe que já vamos.

Com esta fala do pai de Doralice, Dinho consulta às horas e vê tratar-se de dezesseis horas já. O senhor Belmont, colocou meio copo de pinga no seu fundo grosso, e virou em um só gole, dizendo.

- Pra abrir o apetite. Vamos chegar na cozinha tomar um café?

Que Dinho responde.

- A sim vamos, obrigado.

Dinho levanta lentamente, para não dar vexame. Já que podia sentir, pouco de desequilíbrio, efeito da branquinha. Mas movimentando-se com cuidado, logo estava assentado em volta da mesa da cozinha, que diga-se de passagem, estava sortida. Pães, broa, bolo, doce de abóbora, banha de porco, frango ensopado, batata doce, mandioca, um deleite. Assim foi servindo-se, até sentir-se satisfeito. Quando diz.

- Deus que ajude, tudo estava muito delicioso, mas já estou satisfeito. Quando a mãe de Doralice fala.

- Coma mais.

Que Dinho responde.

- Não, Deus que ajude mesmo dona Maria, está tudo delicioso, mas já estou satisfeito, obrigado.

Quando Dinho outra vez consulta às horas, e vê tratar-se de dezessete horas já. Pensou como o tempo estava fluindo, agora que ele estava bem mais à vontade. Imaginou que seria adequado retornar para casa, já que não tinha o hábito de beber tanto, e estava sentindo a visão embaçar vez em quando. Então fala.

- Dona Maria, senhor Belmont, agradeço do fundo do meu coração por essa tarde, pela confiança em permitir o namoro entre eu e Doralice. Mas vejo que já está um pouco tarde, e devo voltar pra casa. E com sua permissão, gostaria então de vir no domingo próximo, para prosear com Doralice.

Quando o senhor Belmont responde.

- Sim, será bem vindo.

Dinho então agradece.

- Mais uma vez obrigado por tudo.

Disse isso e foi levantando para sair. Quando outra vez o pai de Doralice se pronuncia.

- Minha filha, acompanhe seu namorado até o portão.

Nossa, ouvir essa fala, fez com que Dinho fosse tomado por um sentimento indescritível de missão cumprida. E assim foram os dois em direção ao portão. Dinho então olha Doralice nos olhos, segura levemente sua mão, e traz até a boca, onde desprende leve ósculo, nas costas da mão direita da moça. Despediu-se e dizendo.

- Até domingo então, tchau.

Pense em uma semana aparentemente longa, mas eis que chega o domingo. E imediatamente após o almoço, Dinho segue para a casa de Doralice. Camisa e calça engomadas, sapato brilhando. Ao menos estava assim ao sair de casa, mas já chegando na casa de Doralice, o sapato já trazia uma fina camada de poeira, algo normal ao trafegar por estradas de terra, Doralice o aguardava na área, e a medida que Dinho aproximou-se, ela saiu à frente do portão para recebê-lo.

- Boa tarde Frederico!

Cumprimentou Dinho, com sorriso nos lábios. Doralice estava linda em um vestido de tecido cor de rosa claro, com detalhes de flores. Realmente parecia a mais bela flor entremeio à um jardim.

- Boa tarde Doralice!

Respondeu Dinho, que admirava encantado todos os movimentos da moça. Quando Doralice fala.

- Vamos entrar, podemos nos assentar na sala. Papai está tirando uma soneca, e mamãe está na cozinha.

Assim seguem os dois até a sala e sentam-se no sofá, um ao lado do outro. Mas guardando uma distância considerável, pois da cozinha dona Maria à todo momento, lançava olhares na direção dos dois. Por alguns minutos, tiveram conversando sobre assuntos aleatórios. Até que em um ato de ousadia, Dinho procura a mão de Doralice e levemente passa a segurá-la.

E assim, vigiados de perto pela mãe de Doralice e mais tarde pelo pai, que acordou e veio sentar-se na sala também. A tarde foi fluindo. E por volta de dezessete e trinta, Dinho imagina já estar na hora de ir para casa. Não convém abusar da hospitalidade dos futuros sogros. Tudo é ainda muito recente, quem sabe mais adiante possa ficar até um pouco mais tarde, quem sabe.

Despediu-se dos pais da moça, que o acompanhou até o portão. Onde desta feita, além de beijar a mão de Doralice, olhou na direção da porta e janelas, onde não pode ver ninguém na espreita, foi seu aval para dar um rápido beijo no rosto da moça, bem próximo da boca.

- Vou ficar com saudades, tomara que chegue rápido o domingo que vêm.

Dinho disse isso e foi se despedindo. Onde Doralice também falou.

- Também vou ficar com saudades, vou contar às horas até chegar o domingo. Tchau!

- Tchau minha linda, até domingo.

E assim foi, a cada três passos olhava para trás e acenava. E foi assim até onde não era mais possível enxergar Doralice.

Alguns domingos se passaram, sete pra ser mais exato, de namoro é até de planos. Eis que no oitavo uma facilidade, onde o senhor Belmont estava viajando e dona Maria precisou atender outra filha já casada, que estava grávida e entrou em trabalho de parto. Dinho e Doralice decidem fugir. E assim o fazem, pulando muitas etapas. Prática um tanto comum na época.

E mais ou menos assim eram os pedidos de namoro. Já o que vinha depois... era outra história...

FIM

“Está é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou acontecimentos, terá sido mera coincidência “.

mmdp- 16/03/23

Marcos Martins De Palmeira
Enviado por Marcos Martins De Palmeira em 16/03/2023
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