VERME

Corroía sem vontade de corroer.

O tempo corroeu a matéria.

Deixe de loucura, Walesia!

Nada, Florivaldo, o tempo corroeu a matéria.

Somos vermes.

Só fico imaginando, como éramos.

Desculpa Florivaldo, fico imaginando na velhice, com a voz rouca, ainda com o peito cheio de ar.

Falar do passado.

Éramos minhoquinhas famintas e hoje estamos aqui, carregando o passado neste cérebro.

O oco na minha cabeça fervilha, como frieira querendo se sarar.

O cérebro é uma rede eléctrica que distribui estímulos para os membros superiores e inferiores.

Somos uma rede eléctrica, com postes e tudo, Walesia.

Bem-isso, Florivaldo, os órgãos inferiores são para filtrar o sangue e cuidar da respiração.

Não sei bem se é assim mesmo.

Eu gosto de ter um tempinho só para admirar o corpo humano.

Faz bem para mim.

Não sei porque as pessoas admiram pedras preciosas.

Fico a imaginar cada ser que respira neste planeta, de uma circunferência de quarenta mil kms, e fico me vendo lá longe. E tu não pensa nada, verme?

Nada, só penso em viver, a fome vem e o verme alimenta o cérebro, Walesia.

Fico imaginando os verme do cérebro se alimentando, tu sabe Florivaldo?

Nem imagino e não quero imaginar.

Não sei bem, mais deve se o sangue que o alimenta.

A comida transforma-se em fezes e deve sobrar alguma coisa. Sobra e vira sangue.

Vamos comer um frango de churrasco, Walesia?

Sim, Florivaldo, deixa eu pegar a minha bolsinha.

Já traga o lubrificante.

Janiel Martins
Enviado por Janiel Martins em 08/01/2023
Código do texto: T7689514
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2023. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.