BONS NATAIS

Quase sempre, em janeiro ou fevereiro, nas suas viagens como regatão pelo interior de Portel, em que às vezes eu também estava, ele comprava um porco e trazia pra casa pra a gente engordá-lo com as sobras de comida dos almoços e jantares do dia a dia. E assim o porco crescia durante o ano todo num chiqueiro que ficava aos fundos do pequeno quintal da nossa casa, à passagem Alcídes Monteiro, 62; no bairro do Bosque. Num dia de hoje, cedo da manhã, o porco era morto e lavado pra assar inteiro em alguma panificadora da cidade, nos últimos anos, na do nosso amigo Botinho.

O "figo", como ele dizia, a gente já comia assado logo depois do abate. O porco passava a noite toda assando. Naquela noite, ele também colocava em baixo da rede dos mais novos, que já dormiam, um carrinho, uma boneca ou algo parecido.

No outro dia, que era o Dia de Natal, logo de manhã, ele dava o dinheiro do pão pra algum de nós ir comprar. Mas, nesse dia em especial, teria de ser o pão da padaria do Neném, em formato de jacaré. Depois do café, que se estendia um pouco mais, e de organizar algumas coisas pro almoço, enquanto a mulherada preparava o acompanhamento, a gente ia buscar o porco. O transporte era tenso, porém, cheio de expectativas! À mesa, todos nos reuníamos, alguns amigos também. Nossa mãe nos servia e comíamos o porco do seu Zé... Pense num negócio gostoso!

Depois do almoço, íamos pra a casa da vovó e, de lá, pra boca do Muim-muim, jogar bola no areião que ali surgia quando a maré baixava. Muitos primos iam também, e era uma festa só. Umas cinco da tarde, vínhamos embora pra casa, tomávamos um bom banho e vestíamos as nossas roupas novas pra ir pra a igreja à noite. Às vezes, ele fretava um carro pra nos levar e nos trazer pra casa. Quase sempre quando fazia isso, ele levava no porta malas do carro a nosso eletrola, pra tocar uns hinos antes do culto. Depois do culto, voltávamos pra casa... Assim era o Natal do seu Zé e da sua família.

O tempo passou e, alguns de nós, inclusive eu, tivemos de sair de Portel pra viver nossas vidas e voltávamos lá esporadicamente. Mesmo assim, a festa continuava.

No entanto, há uns bons anos, ele adoeceu e, sem a sua saudável e ativa presença, aos poucos, foi-se desfalecendo muito da nossa tradição, da nossa alegria.

Há alguns meses ele partiu, deixando nos nossos corações um imenso vazio e a saudade desses bons Natais que, de certo, não voltam mais.

Bagre, 24 de dezembro de 2022

FELIZ NATAL!