Alegria Alegria - BVIW
Estava terminando a aplicação dos paetês pretos na fantasia de bailarina. Tanto tempo que não pulava carnaval! Era sempre a praia, a família toda amontoada na casa alugada, dormindo em colchões espalhados pelo chão. A boia de pneu.
O maiô apertado. O badejo assado no forno __ como detestava frutos do mar! Mas esse ano combinara com a prima. Daqui a pouco ela ia passar para irem juntas ao clube. Mal podia esperar. Vestiu o collant e o tutu improvisado. Tudo feito com suas próprias mãos. A rua cheia de rapazes bêbados e moças reluzentes ostentava uma animação meio forçada. E a empolgação pelo baile começou a arrefecer com o vuco-vuco para entrar no clube. Era gente que não acabava mais. As marchinhas já corriam soltas no salão lotado de confetes. Na confusão da entrada, perdeu-se da prima. Sozinha, o desalento foi crescendo no peito. Encostou-se numa parede sem saber o que fazer. Um rapaz veio puxá-la pro meio do salão e deixou-se levar. Rodeava-a com passos desajeitados, o colar havaiano ondulando no pescoço. Não estava confortável, olhava à volta e se sentia um peixe fora d'água. Cadê a prima? O que estava mesmo fazendo ali? O barulho da banda, os corpos suados e sorridentes subindo e descendo numa onda de euforia e nada daquilo parecia ter parte com ela. Quis sair correndo, voltar pra casa, cobrir a cabeça com um lençol e amargar seu abatimento no escuro do quarto até vir o sono. A mão invisível apertou o lenço contra o seu nariz e boca. O salão começou a girar. Sentiu a mão invisível quente entre as coxas. Depois, mais nada.
Título emprestado de Caetano Veloso