Leva, que é filho teu
Um dia, Méri chega em casa e a mãe lhe diz:
- Tem um recado pra você ligar na Força e Luz. Deu certo o seu pedido de emprego. Vai lá o mais rápido pra levar documento e fichar. Procura o dr. Telêmaco. E parabéns, mas devia ter me contado...
- Eu nunca pedi nada lá, mãe... Que isso? Não tô entendendo...
- Mas vai lá ver. Esse seu emprego de agora é muito perigoso. As estradas 'tão cada vez mais cheias de carro, de moto e doido no volante. Não esquece: dr. Telêmaco...
Méri foi, era uma surpresa e tanto, a verdade é que não entendia o que estava acontecendo, mas foi. Esquisito, estava bem no seu emprego, não tinha pedido nada, nem por terceiros...
Chegou ao local combinado. Não conhecia. O prédio da Força e Luz era luxuoso. Salas enormes, poltronas amplas e macias, ar condicionado, tudo moderno, silencioso, super eficiente. E meio angustiante.
Dr. Telêmaco demorou para aparecer. Méri suava, apesar do ar condicionado. Ansiedade da brava. Finalmente, o Dr. Telêmaco. Quando começou a falar, parecia um roceiro. Para ser doutor, como o tratavam, não podia falar daquele jeito. Mas isso não era o problema. O buraco era mais embaixo.
Dr. Telêmaco foi logo dizendo, sem vaselina, sem KY:
- Você ficou muitas vezes com uma menina lá da terra do seu pai, olha a foto aqui. A gente sabe tudo, ninguém guarda segredo. Você até teve um filho com ela, não teve?
- Eu? Que isso. Quem teve foi o seu chefe, o do retratão aí atrás.
Telêmaco deu uma risadinha:
- Gostei de você. Vai logo nos finalmente. Então, nada de embromação. O negócio é o seguinte. O chefe não pode assumir esse filho. É casado, homem público, isso ia atrapalhar a carreira política dele, ele quer ser presidente. Você sabe como é o povo, né? A gente te propõe o seguinte: você registra o menino. Você vai receber uma grana preta.
- Mas eu sou um motorista, vivo devendo, todo mundo sabe que vivo quebrado, como é que vou explicar isso?
- A gente já simulou um prêmio de loteria. Isso resolve a questão da origem do dinheirão. Tá nos trinques?
- Vou pensar. Me dá um prazo.
- Hoje é quarta, até sábado tá bom?
Méri sai apavorado da Força e Luz, liga pra um parente que já trabalhou com os peixes graúdos. Pede orientação. O parente aconselha a não fazer trato nenhum com eles. Vão enganá-lo com certeza, assim que ele reconhecer o menino.
Méri volta a falar com o dr. Telêmaco, diz que não vai aceitar. E pergunta, na lata. Como da outra vez:
- Será que vocês vão fazer alguma coisa comigo?
- Não, tem mais três na lista pra tentar negociar. Todos tiveram um caso com ela.
- Posso ir tranquilo, então?
- Pode.
E nada mais aconteceu. Nem mataram Méri nem a mãe da criança. Bem ou mal, está tudo bem.