Cogitou abrir um homem, ou A vontade de saber
Havia uma preferência, naquela época, da parte dele, em adquirir facas. Tinha ficado impactado com a experiência de afiar uma lâmina pela primeira vez na vida no início daquele ano.
Durante o afiar, friccionava levemente a ponta da parte interna do polegar no gume, no fio. Havia um fascínio em sentir sua digital por um triz diante da ameaça que era o aço...
Havia facas de cozinha chef, do exército brasileiro, canivetes, facas de caça, punhais, uma katana e uma cimitarra árabe. Notadamente, as três últimas citadas não poderiam se enquadrar na categoria que despertou o desejo nele. Contudo, os desejos são crescentes. Os poucos centímetros iniciais não mais bastavam.
A sedução do fio de uma lâmina se encontra justamente na possibilidade efetiva de trespassar, cortar, dilacerar. Os alimentos passaram a ser melhor considerados por ele no que diz respeito aos seus detalhes internos. Descascava a maçã por inteiro, verificava os detalhes da carne laranja suculenta do mamão, analisava as estrias presentes em um robusto pedaço de alcatra.
Do alimento para o homem são apenas dois passos.
Porque com o desenvolvimento da apreciação dos objetos resultantes da cutelaria e do poder mortal que deles emergia, a saber, fatiar em pedaços, densa curiosidade passou a povoar o seu íntimo: "como seria rasgar a parte do corpo de uma pessoa?". Um questionamento que vez ou outra surgia, sobretudo quando manejava uma de suas tantas facas.
Havia, naqueles últimos meses, uma vontade daquelas que são essenciais para o progresso da inteligência e efetivação, no mundo material, de seus frutos. Uma vontade em saber.
"Como seria abrir um homem, de cima a baixo, com esta adaga?"
Brusque, 05 de dezembro de 2022.
Cleber Caetano Maranhão.