Pequenas histórias 291
Cortou o pedaço de pizza de camarão com azeitonas verdes e brócolis e, evitando derrubar na toalha impecavelmente branca, com a espátula por baixo, deixou o suculento pedaço escorregar para o prato, onde o garfo e a faca esperavam para entrar em ação.
- Procure evitar muita bebida alcoólica. – dissera o médico.
Mesmo tendo no ouvido o tom da voz evasivamente mecânica do endócrino, encheu a taça de vinho até a borda. Do seu lugar favorito, a mulher o observava com aquele olhar de quem comeu minhoca mal cozida e não gostou. Entretido, não se incomodava em dirigir o olhar para ela, e para que?
- “Nossos olhares não deve se cruzar num olhar só, nossos olhares deve ser para cada olhar o seu próprio caminho.”
Assim pensando, tomou um longo gole de vinho. Em seguida, se apropriando dos talhares, apreciou lentamente pedaço por pedaço da suculenta pizza. Uhmmm! Que delicia, dizia ao lamber os lábios. Espetou uma azeitona. Quando sentiu o gosto meio salgado, estalou a língua ruidosamente. Depois, cuspiu o caroço da azeitona que bateu na parede a sua frente e caiu na toalha impecavelmente branca. Riu num comprimir os músculos de um lado só da face.
O silêncio entre eles se fazia ouvir nos talheres que ao se tocarem, produziam barulho incomodo ou, da faca cortando a pizza como se cortasse metal resistente.
No segundo gole limpou a taça de vinho, onde no fundo ficou apenas a marca vermelha. Soltou um arroto que não esperava.
- Porco. – disse a mulher do seu lugar favorito.
Não se desculpou, pois achava que não deveria. Terminada a degustação, levantou-se e foi colocar o prato na pia quando a mulher falou:
- Não deixe o prato sujo na porra da pia, não sou empregada de ninguém.
Estando em pé, sem ter ainda colocado o prato na pia, olhou para ela rindo ironicamente.
- É mesmo? Está bem, vou deixar o prato no chão, o que acha?
E enquanto falava soltou o prato que se espatifou em mil pedaços no ladrilho branco da cozinha.
- Agora você não precisa lavar o meu prato. – disse ironicamente com o ar de pouca preocupação.
Dizem as más línguas que a sujeira ficou no chão da cozinha por mais de três semanas, até que ele contratou uma empregada.