A Senha - BVIW

Bati na porta. De dentro falaram "fumaça - carro". Falei de fora "tijolo - grão - braço". Abre-te Sésamo! A rapaziada já estava lá fazia um tempo. Casca, Bigodinho, Kilin e Alemão, fumando Minister roubado e folheando a última Playboy. Era um barracão no fundo de um terreno baldio da família do Casca, lá nos idos dos 70, cheio de tralha e com um banheiro pequeno no fundo. Ali a gente se reunia quando queria fumar e ver revista de mulher pelada. Ou só conversar fiado mesmo. Três atitudes bem transgressoras. Pra não correr risco de ser pegos no flagra, tinha senha pra entrar. Cada um escolhia uma palavra e as cinco ficavam sendo a senha da semana. Naquele dia, a gente estava lá com a Farrah Fawcet circulando quando alguém começou a esmurrar a porta num desespero insano e gritar "Abre! Abre!" Não reconhecemos a voz. Alguém tinha descoberto nosso esconderijo. "Parede - longe", falou Kilin, o mais calmo do grupo. "Colchão - borboleta - azul". "Errado! Não vai entrar". "Pelamordedeus ", gritou a voz alterada. "sofá - besouro - verde". "longe - mariposas - marrom". "Sai daqui, caralho! Não sabe a senha, não entra!" E os gritos de palavras desencontradas e socos na porta continuaram por mais um tempo, até cessar por completo. Alemão foi o primeiro a sugerir que a gente abrisse a porta. Uma catinga insuportável nos esperava do lado de fora. Bigodinho estava jogado no chão, todo cagado, com uma cara de humilhação e raiva. "Viu o que me fizeram fazer seus viados? Merda de senha!".

Ana Deister
Enviado por Ana Deister em 06/12/2022
Reeditado em 01/05/2024
Código do texto: T7666057
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