Vencido pelo Perfume
Na balada, Nicole exalava sensualidade. Em meio às luzes e delírio, ela era um furacão de lubricidade. Muitos a desejam, ela, por outro lado, não quis ninguém. Ao se maquiar, escolheu o batom vermelho glamouroso que mais lhe favorecia. Por isso estava aborrecida. Queria apenas olhares desejosos, não filas de homens e mulheres sedentos de toque. Ela é uma mulher perigosa, uma mulher que sempre consegue o que quer. Seja garantidamente ela nunca perde.
Naquela noite em específico, não queria beijos, não queria ser tocada, se assim fosse, usaria um gloss ou um batom nude. Odiava sentir a sensação de que não era compreendida. Por isso, naquela noite rejeitou fervorosamente todos.
No ponto alto da balada, Diego se aproximou do bar, onde Nicole saboreava um drink. Quando percebeu o olhar do homem, brincou com a cereja, passando-a em seus lábios. De longe, Diego sentiu em seu corpo um frenesi sem controle. O contraste entre os lábios vermelhos, vestido preto e cabelos loiros deixaram o pobre homem sem reação.
Os primeiros segundos foram decisivos: olhou-a com atenção e seus olhos desejosos fizeram uma varredura do sensual corpo: O rosto envolvente abrigava um olhar dissimulado e pontual que escondia desejos secretos de uma cruel e implacável mulher, e ele, como homem viril que era, ansiava decifrar; os lábios carnudos em tom de escarlate exalavam paixão; os seios rígidos saltavam do decote desejando ser admirados por todos. O corpo da mulher era pura volúpia. Após contemplá-la com voracidade, Diego caiu em si.
Lembrou-se da sua linda esposa, da casa limpa e impecável que cobrava de sua fiel mulher muito esforço, com toda certeza já estaria na cama, cansada e exausta, depois de um longo dia cuidando das crianças. Ele imaginou a cena do banho demorado... o pijama nude confortável e nada sensual e suspirou pesarosamente. Antes, ele a desejava com intensidade, no entanto, com o passar do tempo, a paixão avassaladora cedeu lugar ao amor. Ele a amava, isso era nítido. Mas com o passar dos anos, o homem sentiu um desejo incontrolável do novo, de novas conquistas, por isso saiu da reunião da diretoria direto para a balada.
Diego degustou seu Bourbon, seu olhar o traiu, pois pousou sobre a mulher de lábios escarlate. Ao fitá-la, sentiu-se como uma fera sedenta, cujo desejo era capturar a presa que o olhava friamente; Diego alinhou sua postura como a de um macho alfa pronto para os infortúnios de uma possível batalha. Entretanto, a imagem da esposa deitada sozinha em sua cama, lhe veio à mente e o quebrou por completo.
Uma lágrima percorreu o seu rosto. Efeito do álcool? Não! Seus lábios haviam provado apenas um gole do Whisky. O que o fez chorar foi o seu caráter que gritava mandando-o retornar para a sua família. Se ele cedesse uma vez, estaria condenado, seria enclausurado pelo desejo e trilharia um caminho sem volta. Ele se sentiu enfeitiçado e estava embriagado pelo desejo. Olhou-a mais uma vez, seu o corpo ferveu, mas a imagem dos olhos amáveis da esposa o fez sentir vergonha de suas próprias ações.
Com intensidade, ansiou chegar em casa e encontrar sua amável esposa acordada, no entanto, já era alta madrugada, ela dormia sozinha na cama em que ele deveria estar. Em sua frente, o pecado lhe chama. Sua mente e corpo desejam a perversa mulher de mãos sujas que ele nem conhecia, sua razão queria apenas sua esposa. E em meio à torrente crise de existência e de valores, Diego se vê perdido na sua própria voz interior que narra ações contrárias.
O homem deu um passo para trás e virou-se bruscamente, tentou fugir do olhar sedento da mulher. Pensou ser forte. Convicto de sua vitória, a inocente criatura foi surpreendida pelo perfume envolvente. Sem escapatória, se tornou a presa, pois foi vencido pelo perfume impactante de Nicole. Se seu olfato não o tivesse traído, ele teria conseguido fugir. Entretanto, estava completamente embriagado pela terrível mulher, e o corpo viril do homem não conseguia se mexer. As mãos suaves e delicadas que escondiam atrocidades tocaram o corpo rígido de Diego e ele se viu perdido na antítese mortífera que o prendia.
Não estava nos planos da torpe mulher se jogar nos braços de alguém. Queria apenas ser admirada, sua obsessão era ser desejada e quando porventura, sentia que já não era o centro das atenções fazia de tudo para voltar ao pódio que era seu e deveria ser só seu.
Enquanto Diego vivia o seu monólogo interno, Nicole percebeu que a rejeição estava às portas. Algo queria roubar o seu lugar no trono e ela não permitiria, jamais permitiu ficar em segundo plano. Matou o marido, o amante sem pestanejar e nunca foi descoberta, na boate, estava prestes a sacrificar Diego. O biotipo dele não lhe chamou a atenção, muito menos se sentiu atraída. Motivada pela possível rejeição, Nicole agiu. Desde que, se tornou poderosa não permitia que ninguém perdesse o interesse por ela. Diego pouco importava para ela, uma vez que era apenas mais um.
A única coisa que a tirava do sério era sentir que não era desejada, estar em segundo plano era algo que nunca deveria acontecer. A obsessão era involuntária, era igual a respirar, fazia parte de sua essência. Nicole aprendeu muito cedo que o seu ponto alto era exalar sensualidade; por isso, vive a sua vida presa na fixa ideia de que ser desejada é o que a faz feliz, por isso concentrou todas as suas energias e isso se tornou uma compulsão, nunca conseguiu se livrar desses pensamentos, mas, na verdade, nunca tentou. Seu comportamento obsessivo irracional é incontrolável.
Quando percebeu o olhar vagante de Diego, sentiu que deveria agir. Pensou consigo: “dane-se o batom vermelho.” levantou-se rapidamente e atacou. A presa virou predadora e a fera tornou-se um cãozinho indefeso. O perfume e um simples toque ensurdecedor de Nicole fez o homem esquecer até dele mesmo. Ele contemplou a tentação tocando sua epiderme, derme e hipoderme até chegar aos seus ossos.
Anestesiado, o homem recebeu um beijo voraz, não o retribuiu, não naquele momento, mas gradualmente, tomou as rédeas da situação e fez o papel do homem conquistador e o homem de caráter foi suprimido. Depois do longo beijo, Nicole viu a reluzente aliança refletir em seus olhos, o homem em sua frente, “tinha dona”, tinha no seu lar uma mulher que o esperava, mas ele agora era apenas um animal marcado de vermelho com as insígnias do seu dono. Vencedora e poderosa, Nicole havia recuperado seu trono. O homem, embriagado de desejo, perdeu completamente os sentidos e o monólogo que antes o atormentava pareceu nunca ter existido.
Nicole havia despertado no homem os sentimentos que tanto queria. Consegui estar no pódio e ele já não era importante. Largou-o sozinho. Ele, sedento, ficou só à mercê do turbilhão de sentimentos que havia experimentado, queria mais, queria tudo, mas ela o deixou só, pois ansiava outros enredos, desejos, crimes e atrocidades. Diego foi deixado para trás sem dó, culpa ou piedade. Ele já não pensa em sua mulher, apenas na loira de batom vermelho cujo nome nem chegou a saber. Parecia até outro homem e de fato já não era mais o mesmo.