________________Mudança de Rota

 

Inês apertou o interfone da casa de dona Antônia. Esperou o tempo de costume, mas ela não atendeu. Sempre aos domingos, aquele era um hábito sagrado, mantido há muitos anos: a visita à mãe, no Mangabeiras, bairro antigo da cidade. Inês se preocupou. Sim, era estranha aquela demora. Tirou da bolsa a chave da casa que sempre tinha consigo para o caso de alguma emergência.

 

Percorrendo os cômodos, Inês chamou pela mãe. Sem resposta, foi até o quartinho de costura. Sentada à velha Singer, dona Antônia parecia dormir. As mãos sobre o colo seguravam a peça que estivera a remendar — uma calça de serviço do filho mais velho. A moça reparou nas faces pálidas, tocou os ombros inertes: dona Antônia tinha partido. E da mesma forma serena com que vivera seus quase noventa anos.

 

Aos prantos, Inês ajoelhou-se ao lado da mãe. Tocou as mãos enrijecidas, alisou o vestido xadrezinho, sempre limpo e cheiroso, acariciou os cabelos prateados cuidadosamente juntados num coque à altura da nuca. Imersa em dor, sussurrou: — Mamãe, acorda, por favor... O que farei com meus domingos sem você?

 

Desde então, Inês mudou a rota das visitas dominicais: em lugar do Mangabeiras, ia ver a mãe em sua última morada. Ali conversava com o retrato colado à lápide, fazia uma prece e deixava uma rosa branca, flor preferida de quem mais a amara na face da terra.

 

 

Tema da Semana: Sempre aos Domingos (conto)