Mente de Delito
Não há quase vestígios materiais, exceto na largura das roupas que pareceram ficar maiores nos últimos meses. E nos últimos dias, a sensação é de que até mesmo água filtrada poderia me fazer mal, se a ingerisse. Pois bem. Passei as últimas horas pensando que o exame pericial deveria ser feito no cérebro. Exame de mente de delito. Seria feito de forma indireta, claro. Mas como periciar os pesadelos? E a falta de apetite? São vestígios perenes e não têm se mostrado nada efêmeros, mas não há lesão aparente. Volto ao ponto de partida...
E já não sei mais o que pensar sobre CID, remédios, profissão. Tudo isso se perdeu dentro de um emaranhado de efeitos desconhecidos e de prejuízos engendrados durante meses, feito conversa dura em alma mole, tanto bate até que bole. E caiu a produtividade que foi impiedosamente cobrada, mas nada disso ficou na carne. Talvez se abrissem o lobo temporal achassem ali no neocórtex algum sinal. Mas qual? Não se pode abrir o crânio pra esse exame de mente de delito...
E as gravações inexistentes, ficaram indeléveis apenas e tão somente no terror remanescente e jaz aqui preso e reverberante entre as estruturas do hipocampo até o hipotálamo. Valham-me, córtex e lobo temporal! Ai meu santo cerebelo! Joga nos meus olhos um espelho e mostra neles o tanto que vivi sem reação e me condicionei ao recolhimento das palavras e a ausência de concentração.
E esse déficit cognitivo agora se amplifica quando converso com a minha melhor amiga, a fluoxetina, que ajudada pela carbamazepina tenta conter o impulso elétrico que me levou a ter tantas coisas trafegando minhas veias e a memória disso tá num relatório que busquei no consultório e diz tantas coisas que não entendo, mas avisa que não há respostas suficientes para que sane o quadro álgico e isso gera uma tal de depressão reativa e um transtorno ansioso desconhecido. Ainda bem que não é compulsivo, mas sei que foi compulsório.
Qualquer dia entro novamente em status migranoso, quando o telefone tocar outra vez e a voz me perguntar quando eu volto ao cadafalso que tanto estrangulou essa mente que vai pra exame de delito e que necrosou a positividade e precarizou minha comunicação, quando me jogou num enredamento inicial. Colocou em mim cordas e titerizou meu corpo e vontade pra a renúncia, desestabilizando e atando os meus passos. Me deixou assim acuada enxergando lobos esfaimados prontos a degustar minha vaga.
Deus me livre desse tormento, dessa fase de enredamento e que eu dê baixa por incapaz de lutar contra essas garras que estrangulam meu pescoço e que parecem esmigalhar minhas vontades. E rogo também que não sejam irreversíveis tais transtornos que andam a destroçar minha identidade, alienar a minha vontade e afastar-me até mesmo de mim...
Como vão periciar essas neuroses assomadas e os distúrbios pssicosomáticos, eu me pergunto a todo instante. Será que o branco dos cabelos é o bastante, já que não existe nenhuma forma de projeção da mente pra que o delito cometido seja comprovado e que esteja eu enfim livre e que se resguarde completa a mente?...
(Texto sobre perícia de auxílio doença por transtorno mental no INSS)