"SEGREDO QUE OS LÍRIOS GUARDAVAM"
Duma casa branca com jardim infestado por lírios, via-se no findar do dia uma doce menina de cabelos louros.
Sempre quando o pôr-do-sol manifestava um adeus, Clara surgia com vestidos até o meio das canelas, sempre floridos e com uma leveza que qualquer sopro delicado podia fazê-lo dançar.
Aquele corpo todo alvo movia-se como que ao sabor do vento, valsando de cá para lá, como se buscasse desesperadamente uma saída, uma resposta.Arrancava as flores como se as quisesse embalar e seus lábios brancos sussurravam uma música quase inaudível...
Mas ainda que não houvesse ninguém por perto, Clara cantarolava com lindos olhos tristes aquilo que não se podia distinguir, com voz tão doce, que qualquer ruído repentino podia estilhaçar.
Nunca se ouvira seu riso, Clara nunca fora vista por outros senão por poucas horas naquele jardim deserto, sempre menina só.Sabia-se apenas que era uma alma doente e fraca...E que sofria de danos irreversíveis na mente.
Como sempre, mais um dia ela saiu para o jardim, colheu seus tão amados lírios e lhes declamou uma poesia oculta.No entanto, nesta tarde, havia algo estranhamente denso naqueles olhos que sempre se mostraram tão delicados.
A menina usava um vestido violeta todo comprido, que não deixava o vento sequer movê-lo e em seus cabelos tão longos, lírios secos pendurados às pontas...
E já não se ouvira mais apenas uma melodia confusa.De seus lábios ainda mais brancos, brotavam sem pudor risos constantes.
Ela dançava uma música que ninguém ouvia, senão seu tímpano de louça fina.
Seus braços faziam movimentos desgovernados e sem coerência.
Seu corpo todo parecia estar sendo embalado por outrem...Aquela bela criança cansava-se lentamente...E aos poucos foi perdendo seus passos na dança.
Parou, com respiração ainda ofegante, e com suas mãos puras que exalavam já um perfume suave, asseou então seu vestido, e estendeu-se toda na grama verde.E deu-se.E foi em busca daquela saída.
Ela havia enfim encontrado aquilo que, ainda em corpo pueril, buscara desde tanto tempo atrás... Aquele refúgio que ela tanto pediu aos lírios em segredo, aquele instante de paz...Aquele gosto inexplicável das estrelas... ... ...
E foi em busca das estrelas.
(TALITA FERNANDA SEREIA)