UM PONTINHO NO MEIO DO NADA

      O vilarejo, um pontinho no meio do nada, todos lá se conhecem, fazem um tremendo fuzuê, são amigos a maioria do tempo, promovem festas o ano inteiro, já começam no mês de janeiro, é um funaré tão grande na passagem do Ano Novo, a mulherada, todas bem arrumadas. Maria com um vestido encarnado de saia rodada e uma fulô de girassol na cabeça, que encanta a mocidade. Rita, de saia grená tão curta que deixa os possuídos de fora, segundo os amigos é uma gota serena, que agita a rapaziada. Maricota, uma viúva engraçada, se veste toda de preto, tem um lenço rendado no cabelo, já casou três vezes, é um papa defunto disgramado, logo surgirá o quarto, pois tem um charme danado. Lili, a mocinha encabulada, dizem ser inocente, olha torto para todo lado, não chega garoto perto, com medo de ser abirobada. Ana, só anda acompanhada, usa um chapéu colorido com fitas e sua parceira uma blusa bem decotada, chama atenção de todos, é uma apetrechada. No carnaval, então, o furdunço é geral, todo mundo ariado, a mulherada canta e dança é um correr frouxo para tudo que é lado. Um moço, chei dos paus, enche o saco por onde passa, fala tanta asneira, um frangote desvairado. Chiquinha, muito gasguita, perturba as oiças da molecada, conversa um miolo de pote, bastante agoniada. A dança rola solta, são dias afoguentados, fantasias de todo jeito, uma porta-bandeira arretada, esbanja um brilho lascado. E quando chega o mês de junho, o lugar fica enfeitado, bandeirolas de todas as cores e uma fogueira aloprada. O sanfoneiro, arriégua! Está todo animado, para tocar um baião, para rebolar a moçada. É todo mundo junto, um arengado falado, um arrodeio na fogueira, pedidos feitos em voz alta, "Um noivo Santo Antônio, meu caritó está montado!". O bichinho do Tião escuta tudo muito assombrado, desta vez ele não escapa, pensa aflito o destrambelhado. O estrambólico do Joca, um cara todo estribado, chega fumando numa quenga, todo alvoraçado, para encontrar a viúva, mas já chegou atrasado, um sibite baleado já com ela atracada. E, assim, tudo acontece, é um lugar abençoado, só vai quem tem negócio, é um fim de mundo engraçado, onde o sol nasce sempre quadrado e a lua cheia enfeitiçada.

 

Antologia HUMOR 

EDITORA SELO OFF FLIP