A ESTRADA PARA DENTRO DE SI

Após descer a serra com seu Jipe, Francisco sorriu ao ver uma grande reta a perder de vista. Desligou o som e diminuiu a velocidade, por fim estava em frente ao seu grande objetivo de vida. Aquela solitude não tinha preço, sua mente estava calma. O carro a 40 quilômetros por hora dava sensação de estar flutuando. Desejou que aquele momento durasse para sempre, não pensava se tinha contas para pagar, relações para alimentar, até mesmo seu ego pareceu deixar de existir, era apenas um espectador do momento presente.

Sempre imaginava que a iluminação era algo com luzes e foguetes, com extraterrestres andando por seu caminho. Se aquele deslumbre era a iluminação, tudo era muito mais simples e ao mesmo inexplicável. Nunca imaginou como uma estrada reta podia conter tanta sabedoria. Ele era parte do mundo como o mundo era parte dele. O fato de reconhecer a não separação permitiu toda a ansiedade dissipar-se, até sua postura ficou diferente. Depois de algum tempo percebeu que poderia ir ainda mais fundo dentro daquela experiência, mas o medo do que haveria depois o fez duvidar por um momento.

Fechou os olhos e esqueceu a estrada, deixou a corrente de vida guiar o volante. O caminho, agora, era para o mundo dentro. Sentiu paz enquanto o mundo ia se dissolvendo. Olhou o carro do alto, espectador de sua própria vida. Viu seu real tamanho perante o universo ao mesmo tempo que latia todo aquele poder dentro de si. Queria explodir. Sua curiosidade o fez expandir mais uma vez, sua mente era a mente de todos. Não estava em lugar algum no tempo. Era apenas um grande observador, vivendo todas as vidas. O barulho do motor começou a soar e isso despertou a vergonha no que restou de sua personalidade, vergonha de suas máscaras e de suas mentiras. Atormentado por sua arrogância, foi julgado.

Abriu os olhos e viu que estava parado no acostamento no meio da escuridão. Um sentimento de culpa caminhava a seu redor. Por fim entendeu que não bastava a compreensão, era necessário andar por estradas curvas para que o conhecimento fosse parte de sua existência. Desde deste dia, preferiu os caminhinhos estreitos porque era ali, onde verdadeiramente forjava seu ser.