O vendedor de mentiras.
Após anos de busca da felicidade nas coisa da matéria, nosso personagem pela primeira vez olha para cima e escolhe ter uma vida diferente.
Imediatamente procura a sacerdotisa Pythía, conhecida por sua sabedoria.
-- Gostaria de uma vida diferente. Uma que me trouxesse a verdadeira felicidade.
Sem demora, a sacerdotisa requisitou: -- Descreva por favor um homem feliz.
-- Certamente um homem bom, capaz de apreciar e extrair felicidade nas pequenas coisas. Um homem honesto, generoso, amado por suas virtudes e não pelo seu património. Certamente um homem que é farol para o mundo. Um homem moderado, disciplinado, amoroso, de raro bom senso, incapaz de sentir raiva, culpa ou mágoa. Um homem que vive a vida no presente, sem medo da vida nem dá morte. Alguém alegre, cuja companhia inspira esperança e compreensão. Inabalável nas adversidades da vida, ninguém sai da sua presença de mãos vazias. Ele reverbera simplicidade, leveza, amor. Este é o homem feliz que desejo ser.
-- Caro, buscador, disse Pythia. Já vi que conhece bem as características do sábio, o único homem verdadeiramente feliz. Vá agora e pratique todas essas qualidade que enumerastes sobre o homem feliz. Tenho confiança em você.
Animado, nosso buscador coloca tudo no papel e começa a imitar em tudo o seu suposto "homem feliz".
Passado uma semana ele retorna.
-- Mestra. Que tristeza. Sai daqui cheio de esperança, mas já no primeiro dia não consegui sustentar nenhuma das características que eu enumerei sobre um homem feliz. Fiz de tudo, mas fui incapaz. Nunca serei este homem.
-- Não desanime ,caro buscador. Tudo não passou de um teste. Sabia que irias falhar. Mas tinhas que descobrir por ti mesmo. Façamos o seguinte. Vamos achar um homem feliz com a descrição que deste e vamos propor uma espécie de "autopsia" nele. Vamos abri-lo ao meio e descobrir quais são as convicções mais profundas deste homem, pois são nossas convicções mais profundas que respaldam nosso comportamento.
A profetisa tinha profundos conhecimento de alquimia e era capaz de fazer um exame em qualquer cadáver para descobrir suas convicções. Finalmente encontraram o cadáver que procuravam. Então ela disse: -- vá, buscador, entre naquela sala e olha para a bacia com agua ao lado do corpo. Lá você conhecerá todas as convicções desse homem feliz.
O buscador assim o fez. Passado poucos minutos, retornou com um olhar muito atonico.
-- Impossível, mestra. Esse homem é praticamente vazio e as poucas convicção que guarda, vai contra tudo que eu acredito. Penso tratar-se de um louco. Eu teria que sacrificar toda minha razão para conquistar tais convicções. Sinto muito.
O buscador foi embora, mas não passou duas semanas retornou, mais uma vez decidido.
-- Tenho uma ideia, mestra. Vamos buscar um outro cadáver de um homem feliz, mas de outras regiões, onde a cultura é diferente. Tenho certeza que vou encontrar outro homem com convicções mais sensatas e que também seja feliz.
Assim, fizeram. Passado alguns minutos analisando as convicções deste homem, o buscador retornou mais uma vez perplexo de sua autópsia.
-- Mestra. Tais homens são tão vazios que me basta poucos minutos para que eu conheça todas suas convicções. Pouco se diferencia este homem do outro. O núcleo básico das convicções mais profundas eram idênticas.
-- E o que decidiu?
-- Estou disposto a fazer alguns sacrifícios para ser feliz, ainda que um louco, mas feliz.
-- Sendo assim, disso a sacerdotisa, vamos procurar a esposa desse homem que deve se encontrar em luto e vamos perguntar quais foram os passos que seu marido fez para chegar a tais convicções e a tal felicidade.
Diante da esposa, veio a resposta.
-- Tudo começou quando meu marido, cansado de sofrer com as buscar materiais, foi visitar um homem muito misterioso que se dizia " vendedor de mentiras". Depois dai as coisas começaram a mudar.
Imediatamente o buscador pediu o endereço do vendedor e foi visitá-lo.
-- Olá, você é o vendedor de mentiras?
-- Sou eu mesmo, o que desejas?
-- Gostaria de me tornar um homem feliz.
-- está disposto a comprar minhas mentiras?
-- Explique-se
-- Bem. Eu tenho uma ideia para te vender, mas já te aviso que não se trata de uma ideia verdadeira. O que tenho para te oferecer é na verdade uma boa ilusão. Mas é um ilusão que se voce seguir a risca e se esforçar para acreditar nela voce vai ganhar uma vida incrível de paz e tranquilidade.
-- Prefiro a Verdade. Por acaso você não a tem?
-- Como eu disse, não se trata da verdade, pois infelizmente a Verdade não é deste mundo, mas essas ideias, se voce acreditar, voce conseguira ter uma vida moral constante, será uma pessoa agradável, leve, de bem com a vida. Sera um bom cidadão, um bom pai, irmão, filho. Será uma pessoa confiável, amorosa, paciente. Como eu disse, são ilusões, mas se você aceitar preencher sua mente e seu coração com essas ideias, voce será naturalmente uma pessoa generosa, compreensiva, que não leva nada para o lado pessoal, que não alimenta preconceitos, que não usará as palavras de maneira vulgar, e sim será impecável com as palavras. Embora não seja a verdade isso que vou te ensinar, voce passará a ver a vida com outros olhos, conseguirá ver a beleza por traz das coisas, saberá resistir as adversidades com bom animo. Terá disciplina para fazer o que se deve e controle emocional para manter o bom humor. Provavelmente até sua saúde física vai melhorar. O mundo será um mundo melhor por você existir e ninguém que vir até você sairá de mãos vazias.
Dito tudo isso, pergunto : você está disposto a aceitar essa ilusão?
-- Terei que sacrificar minha razão?
-- Prefere ter razão ou ser feliz?
-- Já preferi ter razão. Agora já não sei mais. Talvez pudesse me vender uma Verdade que eu desconheça. Prefiro comprar uma Verdade do que uma mentira.
-- Não estas apto a compreender a Verdade. Que escolha você fará?
-- O que será exigido de mim?
-- Disponibilidade, um pouco de boa vontade e muito esforço, o resto é comigo.
-- Terei que aprender muita coisa?
-- Quase nada. Mas terás muito a desaprender.
-- Eu aceito.
Assim, o nosso buscador desaprendeu sobre escassez e separação e foi preenchido por abundância e união; desaprendeu a culpa, a condenação e foi preenchido pelo perdão e não julgamento; desaprendeu sobre o medo e foi preenchido pelo amor; desaprendeu sobre acaso e tomou consciência sobre uma pedagogia amorosa e divina onde nada escapa.
Com o tempo o buscador entendeu que todo o sacrifício da razão que pensava fazer, era na verdade sacrifício de ilusões, sendo, portanto, sacrifício de nada. O buscador aprendeu a confiar na intuição, ainda que não entendesse com a mente. Suas convicções se aprofundavam e agora que era um homem feliz e que se aproximava da morte, se perguntava se o vendedor de mentiras, não estava a vender a Verdade. Se perguntava, quem de fato era aquele vendedor tão sábio.
Como que ouvindo sua indagação, o vendedor disse: Eu sou o Espírito Santo que caminha em você. E sim, ainda é ilusão o que eu vendo, meu caro. Uma espécie de sonho feliz. Mas é um sonho que te coloca na porta da Verdade. O último passo é um mistério que escapa até a Mim.