"Distillers" (fragmentos de um romance)

Após tê-lo reencontrado na celebração das bodas, cumprindo todo o ritual familiar e a seguir termos passados horas de encantamento no apartamento dele até ao raiar do dia, compraz-me senti-lo respirando profundamente a meu lado. É só!

Não pretendo lhe contar sobre minhas lutas diárias, eu exponho meus sentimentos como roupas numa vitrine e estou cansada de me promover à toa, ninguém está disposto a pagar o preço de me ter por completo, esquecem-se da etiqueta, já quiseram me devolver ao primeiro deleite, e ainda voltam com direito a trocas. Estou cansada de me vender para o mundo sem conhecer realmente o comprador.

Hoje não estou aqui tentando mostrar a quem quer que seja minhas tripas, coração e querer que as comprem como carne fresca na feira. Não vou dissertar sobre as minhas fraquezas, minhas crises, e me boicotar como costumo fazer, pelo menos não hoje, deixo para o próximo mês quando voltar a Sampa, uma liquidação ou um leilão de quem dá mais pelo meu coração.

Cansei de me entregar ao tudo e ficar com nada, de ser luz e brilho e depois me tornar uma decepção. No começo tudo tão espontâneo, tão interessante, quase não me perco com as palavras e com o tempo vou virando indecisão, desespero, a ponto do desequilíbrio da falta de auto controle, eu não preciso presentear nenhum fornecedor de prazer com as minhas incertezas, nem com a minha tristeza constante. Ninguém precisa saber do meu choro, nem das minhas despedidas, das mensagens que espalho por aí, ou prego na geladeira, na porta, aqueles avisos "para não esquecer, de que não posso lembrar-me de você", "para não esquecer de que por hoje não te envio mensagens, nem te ligo", "para não se esquecer de mim".

Meu coração não está a venda. Cansei de estar em promoção, cansei de ter certeza de tudo e no segundo seguinte não ter certeza de nada.

Talvez se tivesse me dito algo horas antes. Se tivesse chegado mais cedo, me telefonado. Estou cansada de estar à venda em troca de carinhos sexuais. Encaram-me, criam ilusões, me experimentam, os olhos brilham. “Talvez deva dar uma ajustada aqui”, “mudar um pouco a cor”, diminuir os excessos”, "não serviu, não gostei, não quero", cansei de esperar alguém que me leve sem ajustes, sem mudanças, que goste do que vê, sem devolução, sem querer costurar meus defeitos.

BiaSil
Enviado por BiaSil em 11/08/2022
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