BOLO PARA GALINHAS (BVIW)

 

 

Minerva há dias cabisbaixa. Não era comum vê-la desse jeito, sempre tão alegre.

 

- Ô, mulher, se apruma! Não aguento mais chegar em casa e ver sua cara de sétimo dia.

-Ah, tia, me deixa quieta, por favor... – Num som quase inaudível, a sobrinha pediu.

 

Na verdade, Minerva dizia não saber o motivo do aparente desânimo, mas ela sabia. Foi uma soma de contratempos e de insatisfações que geraram toda apatia. Queria fugir dos problemas. A vontade era encolher-se em forma fetal e aguardar que o universo da sua vida retornasse ao eixo normal como nos bons tempos. Os meses longe da família de origem contribuíram para a prostração. Sem a risada do Hermes era como um dia sem luz. A cor, o som, os sentidos, tudo se perdia. Era o irmão quem a renovava em esperanças nos momentos de apagão interior.

 

Tia Zulu voltou para sala com uma generosa fatia de bolo de coco. Para ela tudo se resolvia com alguma delicinha. Minerva, porém, ficou ciscando o bolo qual galinha de papo cheio, sem vontade alguma, embora se esforçasse em não magoar a tia. De repente, do nada, uma lembrança aflorou, e Minerva deu uma gargalhada. Quando ela e Hermes, ainda pequenos, foram à casa da vizinha, o bolo solado com cheiro de ovo estava difícil de comer, os dois amassaram em pequenas bolotas e jogaram para as galinhas. As trinta penosas não saíam da porta da cozinha. Dona Geruza, que contrariada por desconhecer o motivo daquele alvoroço, gritava: 

 

- Creeeedo! O que deu em vocês? Saiam daqui suas abusadas!

 

As crianças riam, que riam, e riam sem parar. 

 

E com a doce recordação, a luz se reacendeu na alma de Minerva.

 

Tia Zulu tinha razão.

 

 

 

Tema proposto pelo BVIW: "Um dia sem luz".

 

(BVIW - *BECOMING VERY IMPORTANTE WRITER/ "Tornando-se um escritor muito importante").