Maria e Marias, quantas coisas para contarem emudecidas pelo tempo. Hoje, vivem em lares para idosos, cada uma com a sua história. Maria José, uma senhora que perdeu os pais, solteira, sem filhos, apenas uma irmã, trabalhou por muitos anos numa única empresa, exercendo com maestria a função que lhe foi imposta, até o dia de sua aposentadoria. Foi para aquela casa, por vontade própria, após sofrer derrame cerebral que a deixou com uma deficiência. Maria Joana, uma idosa faceira, adora adornos, morava com um sobrinho. Hoje, muito triste por ter sido abandonada, por tirarem seus pertences, sua casa de morada e tudo o que construiu vida afora, sendo convidada para um passeio de carro e deixada ali e nunca sequer visitada. Maria Soledade, após perder os familiares, vivia nas ruas da cidade, carregando nos braços uma boneca e um cachorrinho, e recolhida para o abrigo. Porém, pouco se sabe de sua história, perdeu a voz num acidente vascular cerebral. Sabe-se, apenas, que confeccionava bruxinhas de retalhos para sobreviver, ofício aprendido com a sua mãe. Maria de Lourdes, alagoana, muito agitada, pronuncia termos pornográficos, foi abandonada por familiares numa cidade vizinha. Partiram e a deixaram sozinha, sendo também recolhida para acolhimento e nada se sabe de sua trajetória. Maria Salustiana, morava com a única filha que a deixou naquele lar, uma pessoa muito triste, chorava muito por ter sido desprezada. Segundo ela, passou a sua casa de morada para a filha, trabalhou muito e de repente foi jogada fora, se diz bem cuidada, mas nada que substituía o amor familiar. Maria Tereza, uma senhora que perdeu o marido por assassinato, tinha posses, frequentava a sociedade, anda arrumada, sandália de saltinho, colar, brincos e pulseiras. Sem ninguém, e, após o ocorrido, mudou-se para os cuidados daquele lar, onde assiste as mais frágeis, apesar dos traumas, é alegre e acolhedora. E, assim, muitas vidas ceifadas em suas histórias inacabadas, muitas lágrimas roladas no rosto de cada uma, pelo abandono, por terem perdido a serventia, a falta de tempo e o desamor dos entes queridos. Hoje, cravados no olhar, no semblante e no próprio caminhar cansado e trôpego de cada uma delas. Muitas Marias se vão, sem direito a uma despedida, a um abraço, um aperto de mão, um beijo ou um simples gesto de carinho, amor e gratidão dos seus entes queridos.