Futebol moleque
Descansei o controle remoto das cortinas motorizadas sob a enorme mesa de reuniões, fechei a porta do meu escritório e segui para tomar o elevador. Eu estava no antepenúltimo andar e o destino seria o heliporto. Minha vida era assim: um zigue-zague de viagens pelo Brasil e exterior fechando negócios gigantes de compra, venda e fusão de empresas. Especializei-me nisso e assim eu vivia. A vida particular, de ternura e amor, já tinha sumido há anos.
O elevador custou a chegar e, em fração de segundos, reportei-me à Vila Jurema, a minha vila, a vila onde eu nascí e onde eu aprendí a jogar futebol. Era futebol de várzea, daqueles que a lama tomava conta da gente em dias de chuva. Era futebol de verdade, sem chuteiras, muita esperança e ousadia.
Foi lá que fui fisgado por um olheiro. Foi de lá que saí para o mundo sagrando-me um vencedor, jogando em times de excelência até a idade dar os seus inevitáveis sinais. Com dignidade larguei os campos e, com as contas fartas de dinheiro, enfrentei o mercado com agenciador de empresas, mercado no qual me mantenho em alta velocidade para não perder o ritmo.
Gosto do que faço, até sou um pouco feliz; mas o que eu gostaria mesmo era de estar, neste momento, no campinho da Vila Jurema, com meus amigos queridos, jogando uma pelada das boas e aguardando para, no final, tomar uma gasosa no Bar do Tide.
Rosalva
09/05/2022