sombras das estrelas

Dentro do plano terreno, você anda pela terra batida. Ela foi nutrida pelo calor do sol, aconchegando o seu caminhar. Despida de quaisquer vestidos de asfalto, seu coração deleita-se com o seu tato, enquanto os seus pés estão despidos de quaisquer calçados, sejam eles chinelos, sapatos, tênis ou botas. O seu andar é guiado por luzes terrenas. Luzes que ele conheceu a vida inteira, e após tantos anos, tantas alegrias, tantos choros, tantos nascimentos de cicatrizes, elas permaneciam as mesmas. O mesmo tom de cor, a mesma intensidade, o mesmo brilho e a mesma rede de distribuição de raios luminosos. Nenhuma mudança. Nenhuma mudança perceptível. Sentia que elas ainda eram familiares.

Afastado do caos urbano, você se vê livre de todas as pressões externas, os maldizeres e os desvios do rio que conduz a sua jornada. Você não ouve vozes. Você não sente puxões. Você não sente nenhum agarrar.

Você está sozinho. Você, você e você.

Olhando para o céu, é possível observar as estrelas. Pontos luminosos no céu. Focos pontiagudos de luz. Em um certo momento, você pensa que elas formam algum tipo de padrão, como se tivesse tentando lhe dizer alguma coisa. Em outro momento, você pensa em formas. Formas que elas poderiam estar desenhando. Figuras. Desenhos. Pessoas. Animais. Em um momento mais à frente, você não consegue ver nenhuma forma de comunicação. Elas estão lá, e apenas lá. Guiando o seu caminho. Sinalizando o seu caminhar. Levando-o ao seu destino.

Você tenta levantar o braço. Abrir a palma de sua mão. Esticar os dedos. Agarrar os pontos luminosos. Tomá-los para ti. Guardá-los. Segurá-los. Protegê-los. Tal possibilidade, no entanto, é inviável no momento.

Não são mais estrelas. São sombras. Sombras brilhantes incrustadas em um brilhante lençol escuro. Não é de seu conhecimento quando, mas elas mergulharam no pós-vida. Com uma explosão, elas partiram. Sem anúncio, sem grito, sem socorro, sem pedido de ajuda… Elas se foram. E você, nestes últimos tempos, foi guiado por apenas registros de existências longínquas que não respiram mais.

Por mais brilhantes que possam parecer, as sombras não podem iluminar novos caminhos. Elas são apenas lembranças. Lembranças de referências. Úteis no passado, descartáveis no presente.

Você volta a olhar para o plano terreno. Você olha para as luzes que guiam o seu atual caminho. Admira o tom de creme emanado por elas. É encantado pela intensidade dos seus raios. Observa a constância do seu brilhar.

Uma dúvida se desembrulha dentro de sua cabeça. Ela pergunta se é possível encostar os dedos nelas. Deitar a palma das mãos nelas. Pegá-las.

Seus pensamentos se tornaram mensagens. Mensagens que se tornaram comandos. Comandos que se tornaram ações. O braço saiu da zona de conforto, e prosseguiu em direção à uma das luzes. Uma luz que estava em pé, ao seu lado. Uma visão concreta, porém com uma tangibilidade abstrata. Seria possível colocar sua mão sobre uma forma de energia? Sobre um fluxo de energia contido em um ponto de espaço no meio terreno?

A mão navegou no oceano de gás até o núcleo da luz. Seu ponto de irradiação principal. A fonte. E ela encontrou seu limite. Sua proteção. Sua defesa. Sua parede. Era dura e quente.

Vidro.

Um certificado de tangibilidade. Um guia concreto. Uma referência palpável. Um norte acessível.

E assim como aquela luz agraciada pelo seu toque, havia outras nas proximidades. Enfileiradas, sinalizavam um caminho a ser seguido.

Eram as suas definitivas sinalizações. Guias para o seu caminho atual. Não precisaria mais olhar para o céu e ver o passado. Nem sombras. Muito menos pontos intangíveis.

Caio Lebal Peixoto (Poeta da Areia)
Enviado por Caio Lebal Peixoto (Poeta da Areia) em 08/05/2022
Código do texto: T7511785
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