UMA MULHER, UM DESTINO

   Silvana olhou todos aqueles retratos compostos em diversos álbuns, alguns já amarelados pelo tempo, todos mostrando a felicidade de uma família que teimava em manter a aparência, talvez não fosse um bom negócio por fim a uma união que durava mais de vinte anos e que ela sabia que as conseqüências não seriam boas. Já tivera ímpetos de tomar essa decisão tempos atrás, já articulara planos de sobrevivência mesmo tendo que enfrentar dificuldades financeiras, mas desistira, na sua cabeça pensar melhor seria a solução, mesmo que assim agisse provisoriamente, resolveria dar uma chance a ele e tentar ver se esse casamento poderia tomar um outro rumo e tudo se encaixar numa certa comodidade social, afinal todos merecem uma segunda chance, mesmo ela sabendo que Antônio era uma pessoa completamente avessa a um entendimento. Seria viável agüentar mais algum tempo? Alguns meses ou até anos? Sua paciência já se esgotara fazia anos, mas jogou tudo no esquecimento, no lixo do tempo, lixo esse que a acompanhava sempre e estava ali constantemente como a desafiá-la, a mostrar que era mais forte que ela. Não, tinha que tomar uma decisão e tinha que ser logo, o tempo não perdoa, uma dor que se carrega no peito por duas décadas não deve continuar sendo postergada para uma ocasião futura, pode ser uma perda de tempo que com certeza acarretará conseqüências mais graves, melhor colocar logo os pontos nos is, melhor perder logo o que não traz a verdadeira felicidade e tentar uma outra forma de viver e de ser feliz junto com seus filhos. Pois é, estava decidido, melhor resolver tudo logo, chorar o que tiver de chorar e aguardar que a vida lhe mostre o que pode surgir de melhor.

   Ela lembra com uma pontinha de orgulho aquela tarde ensolarada de um mês que ela mesma escolhera para marcar o casamento, setembro seria ideal, era o mês que lhe agradava, quando se preparava para deixar a vida de solteira. Sobre a cama o vestido de noiva, o buquê e em seu rosto a felicidade estampada sob os olhares das irmãs e da mãe, tudo prometia ser a vida que sempre desejara, amava Antônio e almejava ser mãe em pouco tempo. Conhecera ele há cerca de dois anos, noivaram e agora estava prometida a hora do sim. Silvana não via a hora de adentrar a igreja acompanhada de seu pai e perante o altar mudar os rumos da sua vida junto com o homem que lhe prometia serem felizes juntos até que a morte os separasse. O enlace matrimonial saiu como ela esperava, o tempo foi passando, vieram os filhos, os períodos bons e ruins da vida, coisa que todo casal vivencia.

   Aquelas fotografias em suas mãos, ela prestes a tomar uma decisão que mudaria sua vida, o guarda roupa ali aberto, as roupas e malas já a sua disposição, apenas faltando a coragem, fez com que Silvana derramasse algumas lágrimas. Estava ali sozinha, no seu quarto, os filhos estavam no colégio e o marido no trabalho. Indecisão, foi o que restou para ela que tinha todos os motivos para assim agir, não seria nenhuma novidade se pusesse em prática a ação que perpetrava. Já perdoara uma infidelidade de Antônio, que prometera não mais desapontá-la, mas ela pressentia que ele continuava sendo infiel e em muitas ocasiões discutia com ela e até a ameaçava de bater, coisa que até o momento não havia acontecido, mas Silvana temia, via a sua incompreensão, percebia que o seu amor estava indo por água abaixo e isso não era bom para um casamento de duas décadas. Refletia, imaginava as coisas mudarem e tudo voltar a ser como era antes, ou seja, até cerca de uns dez anos atrás, quando tudo corria bem, porém de lá para cá tudo desandou e ela firme na posição de manter essa união que aos poucos ia se esfacelando, ia aos trancos e barrancos. Queria manter esse casamento, mas algo dizia para que se saísse dele, mas ela insistia, não sabia se conseguiria viver sozinha, apenas com os filhos. Chorava as vezes na calada da noite, aquele romantismo decididamente não mais existia, foram muitas as vezes que faziam sexo sem o menor prazer, era tão somente uma coisa mecânica para satisfazer só o corpo, pois a alma não aceitava e ela sofria. Guardou os álbuns de fotografias, colocou as malas em seus devidos lugares e fechou o guarda roupa, iria pensar melhor, já que nesse momento a campanhia tocava, podia ser os meninos chegando do colégio ou até mesmo Antônio com aquele bafo de bebida que geralmente ela percebia.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 07/04/2022
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