A rotina na casa da Clara mudou muito nos últimos meses. Depois do acidente que levou sua mãezinha, a avó se mudou para lá e o ritmo ficou lento. Os gritos de ordem comuns deram lugar a uma voz mansa e triste, ouvida raramente. Eram os olhares que  falavam mais entre Clara e Ana. Toda vez que ia pra escola, a avó delicadamente sentava-se diante do espelho com a neta e lhe  trançava o cabelo.

- Menina Clara, a vida é uma viagem. E a última parada não somos nós que escolhemos. Já vivi de tudo um pouco: casei aos 16 anos com seu avô com quem tive sete fihos. Dois ficaram pelo caminho. Perder um filho é como perder a peça de uma quebra cabeça.

- Mas, vó, por que algumas pessoas se vão tão cedo. Deixando uma saudade que dói tanto a ponto de parecer espremer o coração. Ela era o meu laço mais bonito de cabelo!

- Embora controlemos o trem com nossas escolhas, Clara, algumas vezes, é inevitável que ele apresente problemas e, por consequência, acabe parando em lugares não previstos.

- Como no Harry Potter,? Tem um episódio que o Dambledore é morto por um de seus alunos que o odiava por não ser como ele é. Nunca aceitei que morresse. Nem consigo aceitar que minha mãe partiu.

- Filha querida, a morte não é uma castigo, ela é uma aventura. E os bons soldados são convocados cedo para ajudar na missão de proclamar amor pelo mundo.

- Vó, não deixa escamas no cabelo. Não gosto desses peixes. Fica feio. Mas logo a minha mãe, por que não a mãe dos outros?

- Minha filha, por vezes, mesmo não querendo, precisamos aceitar as ondas do cabelo e da vida.

- Com tudo que viveu vovó, como consegue manter-se de pé? Sofreu tanto. Não dói o seu coração quando respira? O meu dói.

- É que na vida, meu amor. Há sempre duas opções: aceitar ou não. E depois de ler a vida que vivi, aceito que, por pior que seja, há sempre algo bom a tirar proveito. Por exemplo, pentear suas ondas. O que seria de mim sem você, meu amor?

- Seria você sem mim, vó... Risos. Mas eu jamais seria alguém sem vir de você, a minha mãe! E as duas se entreolharam, abraçaram e choraram feito crianças, pois eram...

 

Mônica Cordeiro
Enviado por Mônica Cordeiro em 05/04/2022
Reeditado em 05/04/2022
Código do texto: T7488549
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