Olho Mágico

 

Paulo morava num desses apartamentos germinados, cujas paredes dos cômodos dos imóveis eram compartilhadas com as paredes do imóvel ao lado. São essas casas em que os vizinhos, mesmo sem querer, escutam de tudo, até mesmo quando os outros escovam os dentes… uma espécie de cortiço pós-moderno...

No apartamento ao lado ao de Paulo, moravam Yuri, a sua mulher Amanda e o pequeno Fernandinho, filho do casal de apenas 6 anos de idade. Aparentemente tratava-se de um casal jovem, “normal”, ambos com aproximadamente 28 anos de idade…

Nesses imóveis germinados não tem jeito, os vizinhos terminam participando das vidas íntimas dos outros moradores, chega até mesmo a avaliar se o orgasmo alcançado por seus vizinhos foi bom ou ruim, imaginem...

Nos primeiros três meses de convivência com o jovem casal no prédio, Paulo não notara nada muito diferente dos demais casais, até que um certo dia, aos gritos, Yuri acusou Amanda de ter usado o seu cartão de crédito sem a sua autorização, a acusou também de ter vasculhado o seu telefone celular… Amanda por sua vez, embora começasse negando o ocorrido, de repente partiu para o ataque, e acusou o marido de ser um moleque, sem vergonha, pois além de estar se envolvendo com outras mulheres fora do casamento, ainda se dava ao luxo de gastar boa parte do que ganhava como mecânico, presenteando as amantes…

Pois bem, os dias se passaram e as desavenças foram se intensificando cada vez mais... até que um dia vieram as primeiras ameças e os primeiros tapas…

Em meio a essas agressões de todo tipo, Paulo escutava o choro da criança, do Fernandinho, que entre choros, desesperadamente chamava pela mãe… porém,  o que chamava mais a atenção de Paulo era o silêncio mórbido de Amanda, logo em seguida às agressões… e para maior surpresa ainda, cerca de meia hora depois das brigas, o casal saía de casa como se nada tivesse acontecido… Pelo olho mágico, Paulo notara inclusive que o casal descera as escadarias do prédio, ora abraçados, ora de mãos dadas… trocando carícias...

Mas Paulo estava decidido a denunciar aquele cenário de violência doméstica, até porque a criança também sofria com aquele festival de gritos, ameças e tapas…

Então, após mais uma manhã em que a cena se repetira, Paulo pegou o telefone nas mãos e telefonou para a polícia militar, denunciando o que estava ocorrendo naquele apartamento ao lado, e ficou aguardando a chegada da polícia… quarenta minutos depois, chegou à porta do apartamento do casal, uma dupla de policiais militares, que batendo na porta pediram a abertura da mesma… Paulo acompanhava tudo atentamente pelo olho mágico…

Aberta a porta do apartamento, Yuri perguntou aos policiais: - “Está havendo algum problema senhores?” Os policiais responderam: - “Recebemos uma denúncia da ocorrência de violência contra a mulher nesse apartamento, senhor? Gostaríamos de falar com a sua esposa, o senhor poderia chamá-la, por favor?”… Yuri com toda calma do mundo, respondeu: - “Pois não senhores... Amanda meu amor, venha até aqui…” pediu Yuri… Ao chegar à porta, Amanda perguntou: - “O que houve querido?” … os policiais então repetiram para Amanda o teor da denúncia da ocorrência de violência contra a mulher naquele apartamento… Amanda então, rispidamente, se dirigiu aos policiais dizendo: - isto é coisa desses vizinhos mentirosos aqui do prédio, que não têm o que fazer, e por inveja ficam caluniando os outros… aqui na minha casa não ocorre violência alguma, inclusive o meu marido me trata muito bem, ele é um Amor!

 

Humberto de Campos

   Aprendiz Holístico

Humberto de Campos
Enviado por Humberto de Campos em 02/02/2022
Reeditado em 06/03/2022
Código do texto: T7442931
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