A Noiva

Desde pequena foi o que sempre quis. Estar de noiva. O vestido branco com detalhes em vermelho, o padre com a Bíblia, as pessoas a olhar pra ela, o par ideal todo de preto e a música. Uma melodia forte e singela ao mesmo tempo, como os Noturnos de Chopin.

Acorda como se fosse de um pesadelo. O pôr do sol no horizonte em sua hora crepuscular. Suor frio e dores no corpo. Logo hoje, disse para si. E ainda esse cheiro de terra úmida. Tinha que ficar bem, na alma e na carne. Ainda no quarto abre o roupeiro, todo em madeira trabalhada e apanha o vestido. Estranha a umidade e o mofo acumulado ao fundo. E a roupa do noivo ali, como se não tivesse sido usada. Anda pela casa, vazia naquele momento. E gelada também. Geralmente não era assim. Terá que se arrumar sozinha.

As horas passam e ainda não havia chego ninguém para busca-la. Apanha o telefone, liga para o noivo. Ligação sem sinal. Ele deve ter ido pra lá, comenta em voz baixa.Já vestida, sente um desalento. E frio, mesmo sendo verão. Queria casar nesta estação. Em mais uma volta pela casa, uma coroa de flores num canto, apoiada num móvel de mármore. Os presentes ainda fechados, jaziam ali próximo. Parada em frente ao espelho, quase não acredita, a palidez da face contrasta com a roupa. Batom vermelho e maquiagem para esconder a brancura.

Não espera mais. Tem que ir. Mesmo que o coração não bata como de costume. Está bem frio na rua. Nem parece a mesma estação, disse num suspiro. Iria se atrasar. Ao fazer sinal para os táxis nenhum para. E alguns vão vazios. De repente não gostam de levar noivas, conclui. A caminhada lhe fará bem, esquentará seu corpo. Mas não sente seus passos. Ao ver flores pelo caminho não havia buque nas mãos. Brancas e geladas. Nem aliança. Passa por algumas pessoas, mas ninguém repara nela.

Na cerimônia pessoas a olhar pra ela, uma música forte e singela se mistura com o murmúrio choroso das gentes que ali estão. O padre com a bíblia nas mãos, e o noivo, todo de preto. E agora ela, imóvel e gelada, vestida de branco com detalhes em vermelho, como sempre quis desde de pequena. Estar de noiva.

Mas não casada.