Resistência
Quando voltarás para casa? Essa foi a pergunta incisiva de Paulo, ao telefone, à Maria, sua única filha. Ele estava cansado das suas esquisitices, da sua forma volúvel de levar a vida. Entendia o fato de Maria ter perdido a mãe aos cinco anos; mas não era desculpa para tornar-se uma adolescente tão complicada.
Paulo entregara-se à filha desde a viuvez e não lembrara um dia sequer que tenha deixado de mimá-la, com todo o amor de que dispunha.
Mas o tempo passou e a sua vida foi ficando vazia. Maria já se envolvia com amigos e costumava dormir fora de casa vez ou outra para finalizar trabalhos escolares e, em meio a eles, fazer uma festinha aquí ou acolá.
Nessa virada Paulo conheceu Alice no banco no qual trabalhava. Era viúva também, tinha uma filha com vinte anos, discreta, visivelmente inteligente e calma. Não foi preciso muito tempo para afeiçoarem-se um ao outro. Já estavam maduros o suficiente para entenderem que a vida a dois seria construída por eles com base em todas as experiências já vividas.
Passou-se um ano entre namoro e um final de semana em viagem com Alice. Nela decidiram oficializar a união, uma vez que nada os impedia.
Primeiramente falaram para a filha de Alice que, irradiando felicidade, propôs ser madrinha do casamento.
Chegando a vez de Maria a reação foi diversa. Tomada por visível nervosismo sentenciou: “Ninguém tomará o lugar da minha mãe!”, saindo porta afora. Abrigou-se na casa da melhor amiga e por lá já estava há uma semana.
Aquietou-se com a pergunta de Paulo ao telefone. Sabia que precisava entender, que o pai tinha o direito de refazer a vida, mas a dor da perda ainda a perturbava.
Era preciso entender que a vida é cíclica, que nada é eterno e que ela era responsável pela sua vida; e não a de seu pai.
Após desligar o telefone, arrumou a mochila, tomou o primeiro ônibus que apareceu e retornou ao lugar de onde nunca deveria ter saído.
Rosalva
05/01/2022