O Escritor
Ali sentado ao sol, imóvel, olhos parados na distância, as mãos nodosas coladas ao bordão, o velho perecia meditar. Quem medita sai de si mesmo e do espaço envolvente e fica, muitas vezes sem saber a razão, do outro lado do dia comum a todos. Quando o assento de pedra transmitiu o frio às coxas, o homem voltou. Fez descair o chapéu de feltro amassado, retirou o cachimbo do bolso, desligou as mãos do cajado e procurou com os olhos saber mais do lugar. O jardim estava sem adultos e a criançada que brincava longe não contou.
Gostava de serenidade e silêncio. Todas as histórias lhe vinham à mente se todo ele as esperasse. Quem espera, redobra de atenção, toma nota dos pormenores, sente-os ligados às figuras, reconhece nos estranhos a personagem, analisa-a, transforma-a, respeita-a, destrata-a. Há narrativas que suam pelo escritor antes de tomar jeito, outras acontecem como se fossem aventuras interiores destinadas a nunca ocupar mais que pequenas doses de calor, arrepio ou tensão em medos virtuais.
Achou, finalmente, o bloco, riscou nele algumas linhas, tapou palavras inconvenientes e, levantando-se, foi ter com ela.
– Conseguiste? Vi-te a tomar notas. Sim, Leonor. Chegou um conto difícil. Depois de o escrever e polir hei-de ler-to. Prepara-te para sofrer até ao fim.