_______________NARIZINHO

 

Trabalhada na pose, ela desfilava no seu salto alto e modelito atualizado. De onde tirava recursos para cumprir tanta moda, ninguém sabia. Mas quando cruzava a porta do barraco no Morro da Bananeira, quem diria do perrengue em que vivia? Vívien, nome que a mãe copiou de uma novela, era a estampa da arrogância, levando consigo a alcunha Narizinho — e dos mais arrebitados! Achava-se linda. E era. Parecia mesmo que a danada tinha catado pra si toda a boniteza do Morro! As meninas se roíam de inveja do cabelão cacheado, da pele  ouro-bronze, dos olhos  agateados, que ela puxava ainda mais à custa do lápis.

Zé Flávio morria quando Vívien passava no minúsculo short desfiado. Ela sabia daquele domínio e caprichava  no bamboleio. Atrevido! Será que o Zé-ninguém pensava que ela lhe daria bola? Mas nunca! Tinha uns planos para além do asfalto. Quem sabe os Estúdios Globo, hein? Quem sabe algum caça-talento nos trens do subúrbio? Não era assim que Xuxa Meneghel tinha sido descoberta?

O destino deu a guinada: Vívien se desviou dos planos mal calculados, Zé Flávio subiu na vida, prosperou no ramo do som automotivo. Ao entrar no carrão último modelo em frente à loja, agarradinho à sua garota-sensação, o moço deu com uma decadente Narizinho a espiá-lo de longe. Intimamente, riu e pensou:

— Já não é a rainha da cocada preta. E quer saber? Nem se fosse!

 

 

Tema da semana: Nem se fosse (conto)