Despir

Carlos era um daqueles homens que sabia exatamente o que queria. Havia acumulado uma fortuna no mercado financeiro, e podia agora se dedicar ao maior dos prazeres que concebia: ser um predador de mulheres. Não era bonito, mas ostentava todos os símbolos de poder que atraiam o sexo oposto: dinheiro, roupas alinhadas feitas sob medida, o carro importado vindo da Itália, uma imensa cobertura. Foi quando conheceu Verônica, uma escritora ruiva de descendência russa. Mais uma para a lista, pensou. Ela aceitara seu convite, o que só reforçava a soberba auto-confiança de Carlos. Entre um drink e outro, acendeu o cigarro da musa de olhos verdes com seu isqueiro de ouro. Foram para a casa dela. Carlos, a cabeça tomada por seu instinto predador, pulsava. Não demorou muito tempo para que Verônica se despisse. Só faltava a consumação... Então, as coisas mudaram vertiginosamente de rumo. A moça, nua, recitou-lhe um poema de Pablo Neruda, olhando em seus olhos. Depois, um trecho de "Crime e Castigo" de Dostoiévsky, como quem faz uma carícia. Para terminar, cantarolou no ouvido perplexo de Carlos a música "Gracias a la vida", de Violeta Parra. E o homem que se cercava de símbolos de luxo, que sempre viu o dinheiro como um único meio e fim, foi sendo despido de seus símblos de poder, um a um, pela desnuda moça das letras. Perderam seu valor. Restara somente um bem sucedido ignorante. Sua virilidade foi-se esvaindo, assim, como um balão que murcha, e deixou a casa de Verônica sem mais dizer, sem olhá-la nos olhos. Não pode ver o sorriso malicioso em seus lábios.