Terça feira de uma vida vazia
Era o mesmo antigo café em Hemingway sentava oara escrever. Ele ocupou uma mesa de canto, pediu café com leite e um croissant. Para lhe fazer companhia lápis, um bloco de notas e o delicioso sotaque francês dos parisienses.
Pessoas alegres, reuniões de amigos e de trabalhos. Todos os grupos misturados e ele naquele canto sozinho. Escrevia distraído, ouvindo o sotaque das pessoas sem prestar atenção na conversa. Estranho? Muito, mas era assim que ele fazia. O que escrevia? Um diário de uma vida que não era sua. Um escritor? Nada disso, um aspirante ou curioso apenas. Escrevia para fugir, para se impor, para enlouquecer e também não enlouquecer.
Depois do café pediu um conhaque. Bebeu em pequenas doses. Mas escrevia em muitas doses.
Escreveu por duas horas e achou que havia se passado pouco mais de 10 minutos. Pagou a conta e saiu com seus manuscritos numa pasta.
Uma garoa fina molhava seu casaco e sua boina, eram as únicas coisas que o protegiam da chuva. Mas como se proteger dos problemas? Sorriu sem graça. Pensar demais queima o fusível, pensou.
A garoa ficou mais forte, se tornou uma chuva forte que molhava as pedras da calçada. Se escondeu numa marquise. Abraçou a pasta com seus manuscritos contra o peito. A chuva deixou Paris cinzenta. Ouviu lugar nenhum uma canção. Still got the blues? Procurou de onde vinha o som. De luga nenhum. Suspirou, guardou a pasta no casaco impermeável. Se nada mais posso fazer, pensou, como Dom Quixote perdido enfretarei a chuva. Já que não há nenhum moinho por aqui...
Enfrentou a chuva cantando baixo.
"You' re playin' to win...but you lose just the same..."
E o solo da Gibson ficou mais alto reinando solitária no silêncio das ruas.