Apenas um conto
O ano era 1914. Quando aquele ano começou ela achava que seria como o anterior, que tivera sido um dos melhores.
A vida podia não estar ainda como imaginara mas, já havia um ensaio do que sonhara. O primeiro mês foi muito bom, tudo corria devidamente como esperava. Mas, no segundo mês ele chegou, de repente. Apareceu da forma mais improvável possível, afinal, ela não se dava a esse tipo de desfrute. Não tinha a mania de conversar com estranhos e, muito menos, dar brechas para um segundo contato. Mas o fez.
E desse dia em diante, aquele homem se tornara seu único e verdadeiro amor. O que se passou depois foi uma série de momentos mágicos e devastadores, todos no mesmo instante, todos de uma vez. Não havia um dia sequer que sua vida pudesse ser considerada tranquila. Aquele amor trouxe não só o sentido do verdadeiro sentimento como também a certeza que nada mais seria como antes depois dele.
Encontrou sua alma gêmea (sim, ela sempre acreditou nisso). Eles se completavam, sem oposto, e sim, tudo igual. E as pequenas diferenças eram para equilibrar esse sentimento. Ela era mais alegre, ele mais sério. Ela era mais solta, ele mais tímido. E assim suas almas se enlaçavam perfeitamente, suas diferenças tapavam qualquer brecha nessa relação. Perfeita e única.
Ela mudou completamente, pelo amor e pela dor, dois lados da mesma moeda, do mesmo querer, do mesmo sentir. Dias e noites passara sonhando e suspirando por esse amor.
Sua vida virou do avesso, tudo que sabia ou achava que sabia ou havia sentido até aquele presente momento virou pó. Ia do céu ao inferno numa mesma frase, num mesmo encontro, num mesmo olhar.
Cada vez que estava na presença do seu amor, nada mais importava. Faria de tudo por ele, porque sempre acreditou que era assim que se vivia tal sentimento. E mesmo nessa loucura tinha consciência de todos os riscos e perdas que iriam ocorrer despois de tudo aquilo.
Nada mais seria igual, ela mudara completamente, por dentro e por fora. Sua visão do mundo e das pessoas se abriu de tal forma que poderia até mesmo tocar a energia das pessoas. Seu faro pra mentira e dissimulações ficou aguçado. Sentia a falsidade no ar. Percebia a alma das pessoas. Entendia olhares e tons. Tudo ficara mais claro. Sua intuição mais aguçada e nada mais lhe enganava.
Mas apesar de tanto amor, de tanta certeza, de tanta luta, ficar com seu amor era tarefa difícil. A vida se encarregou de colocar barreiras para que os dois corações não se juntassem se vez. Ela tinha ciência de tudo mas, lutaria até o fim pelo seu amado. Ele, por sua vez, batalhava incansavelmente para que pudessem ficar juntos.
E apesar de tanto amor, apesar de tanta luta, dessa vez, o amor não foi suficiente apenas.
Seu amado se foi, perdeu a batalha que por tantos anos tentava vencer.
E ela ficou, e perdeu além do ser amor, sua alma, qualquer sentimento, sua vontade de viver.
Os anos se passaram e ela ainda sente, ainda ama, ainda sonha, mesmo sabendo que a maldita guerra o levou pra sempre. Na memória, apenas os momentos juntos, os olhares, os sorrisos, as palavras, as infinitas declarações, o amor latente no corpo.
Hoje ela vaga pela vida, vivendo, tentando, um dia após o outro. Mesmo sabendo ser impossível amar novamente.