Tempos Modernos
Flores caídas na janela, a porta escancarada para a rua, senhoras sentadas em cadeiras nas calçadas, em frente das casas de pinturas carcomidas.
Crianças de calças curtas e vestidos sujos, de cabelos despenteados e rostinhos melecados de resquícios de guloseimas.
Eu era uma delas. Com dez anos de idade, com meus cabelos dourados e os olhinhos miúdos na cor azul claro.
Corria de um lado para o outro. Aproveitava da melhor maneira a melhor fase da vida, sem pensar que a fase adulta fosse tão complicada, tão cheia de desafios.
Debruçado na janela da minha casa eu vejo o tempo passar. Eu acho que envelheci, os cabelos permanecem dourados, no entanto, são poucos; o corpo que outrora fizeste sucesso com as meninas, hoje não passa de um corpo fraco, onde os braços não tem mais força e as pernas precisam de apoio para manter-se em pé.
A idade chega para todos, mas como eu poderia imaginar que isso fosse acontecer comigo. Ter filhos e ver eles crescerem, indo embora de casa e retornando com esposas e crianças bagunceiras, meus netos. É ver a casa cheia, a mesa posta, e eu sentado bem na ponta e cercado pela família, que distraída mexe nos seus aparelhos celulares, enquanto eu tento puxar conversa, tudo em vão.
Pois é. Hoje os tempos são outros. A tecnologia acabou com as relações interpessoais. Meus filhos vão me visitar, mas não falam comigo. Meus netos não brincam mais como eu brincava, eles se divertem com jogos eletrônicos, dentre outras distrações.
Finda o dia. Um por um meus filhos e netos vão indo embora. Entre abraços apertados e beijos molhados no rosto eu sinto um vazio, deve ser o vazio da saudade; dos tempos de criança, das senhoras sentadas na frente das casas de pinturas carcomidas e dos pés descalços tocando o asfalto quente, sensação que meus netos, criados dentro de enjaulados apartamentos nunca vão ter. Pobre deles, sem infância e sem graça.