A última ceia - BVIW
- Mamãe, estou com fome! Acorde! Gritou Dandara. Já passa das oito e a senhora dormindo. – Vamos preguiçosa, um dia irei levar-te à terra do nunca. Lá tem um rio de merendas. Um pomar de guloseimas, pé de dinheiro e grãos de feijão na orla da abundância. A senhora vai perder? Dou-lhe uma, duas…mamãe!!! – Minha pequena, estou tão cansada. Culpa do travesseiro de palha e do colchão de vara. Faz-me ficar mais tempo deitada. Vou preparar-lhe o café. O que minha garotinha vai querer hoje? E Dandara saltitante respondeu: - Ovos mexidos, dois pães, queijo, presunto, leite, Nescau, cuscuz e carne do sol frita. – Assim você vai engordar. Só tem batata doce. A menina desnutrida, cansada das mesmas respostas, retrucou: por que perguntou-me, então? - Gosto de ver o brilho do seu olhar. A mãe enfraquecida pela falta de comida, deu a última batata para saciar a fome da filha. Viviam no interior do sertão baiano. Sem recursos e desamparada pela sorte, minguavam no desespero da necessidade básica. Tinha onze anos, mas parecia uma menina de sete de tão raquítica que era. Ajudava dona Caçula em tudo. Uma imaginação pra lá de Ariano Suassuna. Sonhava com uma vida melhor, com comida em abundância e dias de algodão. Não sonhava em ser doutora, pois escola lá não tinha. Nesse cenário, teria a vida de Maria, de Joana e de Caçula. A miséria era uma reprodução social líquida e certa. Depois de enganar o estômago, a menina vira-se para a mãe desfalecida, pede mais comida. A mãe já não responde, não grita seu nome, foi para a terra do nunca mais.