A estranha história de Jajá Guaiamu
Janaína Maria de Jesus foi criada pela a avó, a afamada caçadora de caranguejos Cotinha Guaiamu; Dona Cotinha morava para os lados do rio Sorocabinha, viúva de Armando Guaiamu, e mãe da atriz pornô Mercedes Del Rio e Fuentes, uma figura que marcou época na cidade, pois aos quinze anos fugiu com o palhaço Andorinha, sócio do circo “Andorinha e Beija-flor”, e foi conhecer o mundo; voltou um ano depois para deixar a bebê Janaína com a avó, disse que a menina era filha de um estancieiro uruguaio, um criador de gado que não quis reconhecer a paternidade da guria, alegando que Del Rio era também Del Mundo e Del Mar.
Mercedes permaneceu na cidade por dois anos, participou de algumas peças teatrais, e nos finais de semana fazia shows eróticos numa “casa da luz vermelha” num bairro rural; conheceu um gigolô espanhol e foi para a Europa, nunca mais deu notícias, Dona Cotinha sempre teve certeza que a filha foi vendida como “escrava branca” para um xeique árabe e está presa incomunicável em um harém nos Emirados Árabes.
Janaína cresceu sem pai, sem mãe, sem irmãos, sem rédeas e sem educação; vovó Cotinha era alcoólatra e atendia em casa nas horas em que não estava catando caranguejo. Os fregueses de Dona Cotinha eram os velhos pescadores, pedreiros aposentados, todos viúvos e carentes de um ombro amigo, um banho, algumas cervejas e muitos beijos na boca.
Aos treze anos Janaína estava formada, desistiu da escola após bater na professora e levar uma bela surra do filho da mestra; nesta fase da vida sofreu muito bulingue, foi apelidada de Jajá 1.99, Jajá Gasosa, Marmita de Preso, Boia Fria, e mais alguns cognomes depreciativos, mas ficou mais conhecida como Jajá Guaiamu. Aos quinze anos Dona Cotinha virou bisavó com a chegada de Anabela, a primeira bisneta e dois anos depois foi contemplada com Clarabela, a segunda bisnetinha, e ambas sem pai, ou melhor, pai desconhecido.
Algo por demais estranho aconteceu com Jajá Guaiamu ao engravidar de sua terceira filha Angelina, um nome de anjo para uma filha do demônio, Jajá nunca ficou sabendo, mas o sacristão Abelardo espalhou para a cidade inteira a cena que presenciou naquela noite fatídica em que o diabo transou com Guaiamu, às três horas da manhã na passarela do Rocio.
Angelina foi a salvação de Jajá Guaiamu, em todos os sentidos; depois de ter relação sexual com o capeta, temerosa de perder a sua alma para o demônio, Guaiamu mudou completamente, tornou-se uma serva do Senhor, e exigiu ser chamada de irmã Janaína Maria de Jesus, arrumou um emprego com carteira assinada, registrou vovó Cotinha nos alcoólatras anônimos, e cobrou boas maneiras das filhas.
Ao completar quinze anos, o pai de Angelina veio visitá-la, e Janaína temeu por suas almas imortais, mas o diabo falou que alma de pobre tem aos montes e que não estava interessado, e que Janaína podia ficar sossegada, pois só queria conhecer melhor a sua herdeira, Angelina. O capeta deu um anel para a filha, tiveram uma conversa secreta e ninguém ficou sabendo do que trataram, só souberam que Angelina ganhou uma bolsa de estudos para cursar medicina, uma poupança com renda de R$20.000,00 ao mês.
Janaína arrumou um marido, rapaz novo, bem-apessoado, mora na zona rural, amigo do peito do pai de Angelina, o único problema é que o moço desaparece nas noites de lua cheia, mas já estamos entrando em uma outra história...
Gastão Ferreira/2019