MULHERES DA INTERNET

E aqui, no meu apartamento, estou sozinho com a certeza de

nunca ser incomodado por quem quer que seja. Depois do al-

moço , que eu mesmo faço, sempre dou um cochilo e os son-

hos à vezes compensam. Quando acordo, ligo o computador,

checo os e-mails, leio as notícias e bato papo com mulheres

desconhecidas. Adoro essas salas de bate-papo, onde todos

tem a liberdade de mentir sossegados, sem o risco do outro

olhar dentro dos seus olhos. Minhas amigas de bate-papo po_

dem se chamar Cristina, Mércia, Ana Maria, Ione, Suely, Si-

mone, Josiane, Rosana. Elas podem se tornar minhas ami-

gas do peito ou minhas inimigas pelo resto da vida. Advoga-

das, professoras, publicitárias, comerciantes ou simplesmen-

te donas de casa. Solteiras, divorciadas, casadas, enroladas,

elas estão sempre em busca da felicidade, de uma aventura

básica ou simplesmente sacanear seus companheiros.

A primeira que eu conheci pessoalmente se chamava Cris_

tina e era advogada. Morena, baixinha, cabelos lisos e com

um jeito de intelectual que beirava à chatice. Nos encontramos

numa quarta-feira à tarde num shopping no centro da cidade.

Cristina falou do seu trabalho, das causas ganhas e perdidas,

do seu ex-marido, da filha que acabara de lhe dar um neto. Aí,

eu aproveitei e disse que ela era a avó mais bonita da cidade

e ela sorriu. Só que eu dizia isso pra todas que tinham netos.

Quando ela pediu que eu falasse de mim, eu falei só o essen-

cial, esperando que ela ficasse satisfeita. Aparentemente, ela

ficou. Enquanto conversávamos, derramei, sem querer, o re-

frigerante que eu tomava sobre a mesa . Ela sorriu e disse

que meus gestos pareciam de um pregador anunciando o

Apocalipse. Depois de algumas palavras triviais nos despe-

dimos e eu nunca mais soube dela.

JOAQUIM RICARDO
Enviado por JOAQUIM RICARDO em 20/07/2021
Código do texto: T7303859
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2021. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.