MULHERES DA INTERNET
E aqui, no meu apartamento, estou sozinho com a certeza de
nunca ser incomodado por quem quer que seja. Depois do al-
moço , que eu mesmo faço, sempre dou um cochilo e os son-
hos à vezes compensam. Quando acordo, ligo o computador,
checo os e-mails, leio as notícias e bato papo com mulheres
desconhecidas. Adoro essas salas de bate-papo, onde todos
tem a liberdade de mentir sossegados, sem o risco do outro
olhar dentro dos seus olhos. Minhas amigas de bate-papo po_
dem se chamar Cristina, Mércia, Ana Maria, Ione, Suely, Si-
mone, Josiane, Rosana. Elas podem se tornar minhas ami-
gas do peito ou minhas inimigas pelo resto da vida. Advoga-
das, professoras, publicitárias, comerciantes ou simplesmen-
te donas de casa. Solteiras, divorciadas, casadas, enroladas,
elas estão sempre em busca da felicidade, de uma aventura
básica ou simplesmente sacanear seus companheiros.
A primeira que eu conheci pessoalmente se chamava Cris_
tina e era advogada. Morena, baixinha, cabelos lisos e com
um jeito de intelectual que beirava à chatice. Nos encontramos
numa quarta-feira à tarde num shopping no centro da cidade.
Cristina falou do seu trabalho, das causas ganhas e perdidas,
do seu ex-marido, da filha que acabara de lhe dar um neto. Aí,
eu aproveitei e disse que ela era a avó mais bonita da cidade
e ela sorriu. Só que eu dizia isso pra todas que tinham netos.
Quando ela pediu que eu falasse de mim, eu falei só o essen-
cial, esperando que ela ficasse satisfeita. Aparentemente, ela
ficou. Enquanto conversávamos, derramei, sem querer, o re-
frigerante que eu tomava sobre a mesa . Ela sorriu e disse
que meus gestos pareciam de um pregador anunciando o
Apocalipse. Depois de algumas palavras triviais nos despe-
dimos e eu nunca mais soube dela.