O Menino e a Barata
Estava terminando de passar o café, quando ouvi o garoto mais novo saindo para rua. Sabia que era ele porque não escutei barulho da porta sendo fechada. Além do mais, seus pais estavam no trabalho e a menina mais velha, na escola.
- Se teve mão para abrir, com certeza é capaz de fechar!
O garoto nem sequer argumentou, fazia de propósito, só pode.
Queria ver se a casa fosse invadida por seu descuido. Às vezes eu chegava a desejar que isso acontecesse, só para ver o garoto levando bronca dos pais.
Que Deus não escute essa prece!
Deixei o café passando e fui fazer o serviço do moleque. Quando rocei a mão na maçaneta, um zumbido me cortou o ato. Pelo canto dos olhos pude ver a enorme barata voando sobre minha cabeça e aterrissando no sofá. Rapidamente soltei a maçaneta e fui à procura de algo que pudesse acertar na bicha.
Achei ali perto um vaso decorativo e arremessei-o. O objeto passou longe da barata, quicou no sofá e caiu em vários pedaços no chão. A barata calmamente alçou voou e pousou em cima da TV.
Corri para o chinelo que estava próximo à entrada da casa, mas, ao abaixar para pegá-lo, minha bunda esbarra na porta que, com o impacto, fecha-se com força, fazendo a maçaneta soltar-se dela e me deixando trancada pelo lado de dentro.
Segurei o grito na boca. Se alguém me escutasse, viraria assunto de toda vizinhança e longe de mim ser passatempo de fofoqueiro. Eles que arrumem outro defunto pra dissecar!
Com uma nova arma em mãos, mirei bem e joguei. O chinelo acertou a TV que bambeou por um momento e depois tombou para trás. A barata tomada de confiança, atirou-se num rasante em minha direção.
Corajosa que sou, fugi em disparada escada acima. Entrei no primeiro quarto que vi e fechei a porta. Coração acelerado, respiração ofegante. Nem repararei o carrinho de brinquedo que estava no chão, quando vi, já tinha escorregado nele e caído feito manga podre.
Precisei de longo tempo para me levantar, o corpo doía todo. O que me consolava era a ideia de estar segura ali dentro.
Peguei aquele maldito carrinho e o joguei pela janela. Quando voltei, a barata passava metade do corpo pela fresta abaixo da porta.
- Misericórdia!
Subi na cama em um salto. A barata terminou de entrar no quarto e ficou ali parada me encarando. Passei os olhos pelo quarto procurando uma nova munição, mas, os brinquedos estavam todos no lado inimigo. Só havia uma única maneira de sair dessa: pela janela.
Fui me esgueirando de vagar para que meus movimentos não fossem notados pela criatura. Um passo... Dois... Três... Coloquei uma perna pra fora da janela e apoiei a outra no batente. Olhei para trás e vi que a bicha levantava voo novamente. Fechei os olhos e me preparei para o pior.
Um baque alto. A porta foi escancarada.
- Por que jogou meu carrinho fora? Indagou-me o menino do outro lado com aparente indignação.
Em sua chegada repentina, o garoto, sem querer, acabou esmagando a barata na parede e me salvou da criatura. Porém, era tarde demais. O susto que levei com o barulho fora tão grande, que acabei me soltando do batente.
- AAAAAAAAAH!