Sonho de despedida
Apenas uma semana após a morte de minha querida avó, eu tive um sonho que para mim foi inexplicável, mas que talvez alguém tenha alguma explicação ou até várias. Eu estava sentada em uma cadeira, na rua de casa. Era uma casa que nunca vi antes, mas sabia que morava lá. Pessoas sem cores ao meu redor. Em um entardecer tão cinza, que não conseguia distinguir os rostos que ali se encontravam. Eram simples corpos traçados deixando um ar de mistério com suas sombras projetadas na parede, num estado de quase borrões. Sentia-me presa em um quadro pintado na fase azul de Picasso.
Como escapar desse lugar lúgubre de conversas vazias? Tudo o que acontecia em minha volta era oco, sem som, sem vida, sem cor, sem sentido. De repente, uma claridão profunda surgiu, no horizonte. Precisei cerrar meus olhos, para tentar enxergar. Foi então que compreendi. Uma outra dimensão se abria diante de mim. Algo difícil de descrever. Não lembro de sua aparência, mas eu tinha certeza de que era ela. Ninguém mais conseguia enxergar o que os meus olhos presenciavam. A luz então andou em minha direção e me abraçou o mais forte que podia. Não houve medo. Apenas um conforto no peito. O reencontro desejado.
Debrucei-me em lágrimas como uma criança perdida a soluçar. Todos me encaravam sem entender o motivo do choro súbito. O que estava acontecendo comigo? Por que é preciso ter razões para chorar? Não quero mais ter que explicar cada detalhe dos meus sentimentos para quem não se importa com os ventos que me trouxeram aqui.
Desse abraço aconchegante, acordei, ainda com os olhos marejados. Meio confusa e sem jeito. Não pude dizer nada, mas sentia que havia dito tudo sem uma sequer palavra. Não sabia mais o que era real ou irreal. Como poderia eu criar um sonho tão perfeito? Onde fica o mundo dos sonhos, afinal? Para quê e por que foram feitos? Seriam os sonhos o resultado das milhares de interações dos nossos neurônios do sistema nervoso ou algo que vá além de qualquer compreensão humana? Bom, real ou não, eu só sei que amei te sentir por perto outra vez, vovó.