O caminho do vício

Vera nunca passou trabalho. Nasceu em família abastada e viveu, aparentemente, sem grandes preocupações. Embora nunca tendo trabalhado, era formada em Química em uma Universidade muito cara. Casou com um colega de faculdade bem de vida, teve uma filha, separou por imposição do marido e acabou perdendo o rumo e a filha, que preferiu viver com a avó paterna.

Vera vivia de breves passeios na cidade e chás nos finais de tarde com algumas poucas amigas. Em casa costumava folhear revistas que expunham a vida e as fofocas de famosos, além de ler livros de Sidney Sheldon. Sempre pareceu estranha, muito embora uma boa pessoa. Residia em apartamento próprio, sendo proprietária de mais dois, dos quais recebia o valor dos aluguéis para a sua subsistência.

Transitava pela sua família com desenvoltura e praticamente nenhuma reciprocidade, mas não ligava. Ao menos era o que parecia.

Certa vez desapareceu. Não ligava nem mesmo postava coisa alguma nas redes sociais, coisa incomum, já que a sua bandeira estava sempre exposta, como se vivesse um conto de fadas. Costumava postar cafés fumegantes, grifes famosas em shoppings e mãos entrelaçadas com outras mãos, como se fossem as suas e as de quem as pudesse acariciá-las. Pura sugestão.

Como o desaparecimento foi longo, sua irmã Isaura resolveu monitorá-la. Foi quando surpreendeu-se com a sua nova morada. Não mais residia no Bairro de Coqueiros; e sim no de Jaraguá, em um prédio antigo e judiado.

Em uma manhã de verão a viu sair do edifício, tomar um taxi e dirigir-se ao centro da cidade. Passou por uma pequena lanchonete, tomou um café acompanhado de um pão de queijo e, com a bolsa em punho e o olhar altivo, entrou no maior bingo da cidade. Em frente Isaura ficou até às 16h, quando a viu sair, fumando um cigarro após o outro. Atônita Isaura a abordou. Não a reconheceu. Estava bêbada e fedia a cigarro. Carregou-a pelo braço para a mesma lanchonete e lá a fez confessar o que estava acontecendo, quase aos gritos. Sem precisar perder muito tempo, frente à indiferença de Vera, entendeu que ela era viciada em jogo há pelo menos dois anos e que já tinha entregue, como pagamento por perda, o seu apartamento anterior, herança de seu pai. Nada podia ser pior do ver a irmã enrelaçada por algo tão estúpido. Soluçando questionou-a se ela sabia o que estava fazendo.

As juras de arrependimento de Vera voaram com a fumaça do seu cigarro e Isaura saiu aturdida e culposa por nunca ter entendido o comportamento da irmã, a tempo de poder fazer algo que a recuperasse.

Escrito na Oficina "Provocações" - Editora Pragmatha - módulo 04

Rosalva
Enviado por Rosalva em 09/06/2021
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