O dono de academia

Ademir é velho. Tem uma altura considerável, bem como uma circunferência de braços incomum para um homem de sua idade. Contudo, o restante do corpo entrega a passagem do tempo. Há quarenta e poucos anos conserva um negócio iniciado por ele mesmo: uma academia de ginástica e musculação.

A persistência de seu negócio impressiona. Nos últimos anos, as grandes redes de academias tentaram, com seus reais, com seus dólares, a aquisição do vasto galpão equipado com máquinas antigas que ele mesmo mantém. Sempre disse não às propostas. Os proponentes ficam incrédulos, porque poucos negariam as somas oferecidas.

Ademir é velho, viúvo e não deu continuidade ao sobrenome na figura de possíveis filhos. Sua esposa, quando viva, não quis. Ademir não forçou uma situação porque para ele tanto fazia. As extraconjugalidades constantes e sem remorsos de sua parte, auxiliavam em não pensar muito sobre a questão. Porém, de um tempo para cá, pesa-lhe não ter tido um filho.

A manutenção da academia o mantém vivo, mas não vivaz. Ele a abre todos os dias pela manhã às 05:30h e permanece nela até às 11:00h. Retira-se até sua casa há quadras dali, onde rega seu jardim antes do almoço que ele mesmo cozinha. Dorme até às 15:00h. Após a sesta, retorna para a academia. Saí de lá às 22:00h.

Mantém a academia como mantém o jardim de sua casa. Feio o jardim. Há margaridas que crescem entre temperos, ervas e matos mal cuidados. Ele não cuida com o esmero de um jardineiro, apenas rega e arranca os excessos.

Similar ocorre na academia. Ele olha para tudo aquilo como se fosse o jardim. Solicita a um cliente que guarde as anilhas após o uso, pede que a jovem seque o banco suado, orienta os profissionais de Educação Física - seus funcionários - que evitem conversas paralelas e prestem atenção aos usuários.

Ele contempla a academia como que um cenário que dele depende empenho, mas a essas alturas sem sentido. O esforço das moças em fazer crescer as coxas e glúteos, o árduo trabalho dos homens em fazer ficar protuberantes os peitorais e bíceps, são rotinas que não mais lhe tocam. As moças do século XXI, na emolduração linda que são seus corpos que transpiram em tecidos sintéticos justos, colados, não mais comovem Ademir.

Ele observa tudo aquilo esvaziado de sentido. O vasto galpão, as máquinas de musculação, os jovens, os homens, as moças, o dinheiro da mensalidade... tudo, tudo aquilo: um jardim a ser cuidado num esforço mínimo para que muito mato não se alastre. É assim que o velho Ademir procede.