Se Deus é contra nós, quem será por nós?

Deus acordou hoje zangado. Num tédio celestial decidiu que iria ceifar uma cidade inteira. Quem poderia resistir à fúria do Todo Poderoso? Ele comunicou a notícia aos seus imponentes profetas: “Diga a este povo que estou indo matá-los. O ranço por estes moradores subiu às minhas narinas e nada que eles façam poderá salvá-los. Sangue de bois e carneiros não me comovem mais. O sacrifício que quero é o de maus meninos: aqueles que não frequentaram a igreja no serviço dominical, que se divorciaram, que “escolheram não esperar”, que curtem uma cerveja, que ouvem música popular. Morrerão todos”. No dia determinado, Deus executou seu plano. Lançou terremoto por toda a cidade. A terra sacudiu, os prédios chacoalharam. Havia vidros estilhaçados por toda parte. As pessoas assustadas correram para lugares de segurança. Os mais novos ajudaram os mais velhos a se protegerem. Até que o terremoto parou. Nenhuma pessoa ficou gravemente ferida. Nenhum prédio foi a baixo. Aquela cidade havia se preparado para a possibilidade de eventos como esse com tecnologias de engenharia. Na praça da cidade, as pessoas comemoravam juntas que todos estavam bem.

Furioso e decepcionado, Deus não desistiu de executar justiça sobre esses curtidores de funk e pagode. Mandou desta vez gafanhotos no céu da cidade. “Não falhou no Egito, não falhará agora”, lembrou o Altíssimo. Enquanto a nuvem de insetos se espalhava, a cidade se uniu e lançou inseticidas sobre aquela nuvem e utilizou tecnologias de controle de pragas para o monitoramento. Tudo foi resolvido em pouco tempo. A cidade comemorava mais uma vez o resultado de seus esforços. Os profetas do Altíssimo então vociferaram ainda mais alto. “Eis que a maior praga é esta que está por vir. Seus dias de boemia estão no fim”. A vingança de Deus sobre os maus meninos da cidade chegava a um momento decisivo. Um eclipse solar inesperado impedia a luz solar de alcançar o solo. Uma escuridão cobriu toda a cidade. “Quero ver agora curtirem sua vida de pecados debaixo dessa escuridão”, bradou a voz como trovão. Porém, escondidos dos olhos de Deus, embaixo daquele negrume, as pessoas daquele lugar nunca foram tão livres. Sem a visão clara, aguçaram os outros sentidos. Luzes artificiais foram acesas e deram um brilho todo especial àquela cidade, que saía às ruas para acender fogueiras em companhia de amigos e muita comida. E quanto mais o Deus mimado da religião insistia em punir, mais o povo se unia em cooperação uns com os outros por sua liberdade.

Gil Barreto
Enviado por Gil Barreto em 29/05/2021
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