A Prova de um Cristão
O dr. Carlos Andersen Macro teve um pesadelo e acordou tremendo. O relógio digital na cabeceira da cama marcava 10 para as 6 da manhã, já estava quase na hora de levantar, se arrumar e sair para o hospital.
Levantou meio atordoado e calçou as pantufas. Enquanto usava o vaso pensou no pesadelo que teve com sua falecida mãe. Depois de lavar o rosto na pia decidiu orar até as 6:30, que era a hora que o seu celular iria despertar.
Carlos orou de joelhos até as 6:30 e desligou o despertador de seu Iphone de ultima geração. Tomou um delicioso banho quente, pôs a calça social preta e a camisa branca, juntas elas eram mais caras que o aluguel de uma casa. Abriu a gaveta de relógios e escolheu um TAG Heuer Carrera com correia de aço polido e fundo azul. Pegou sua mochila, orou novamente, pingou gotas de seu óleo ungido em sua cabeça e saiu de casa.
Antes de entrar em sua BMW pingou mais algumas gotas do óleo sobre ela. Entrou e ligou o rádio, que só tocava musicas de cunho evangélico. O painel do carro mostrava 33 graus. Ele fez quase todo o tranquilo trajeto de sua casa no Leblon até o hospital publico na Zona Norte.
Parou em um semáforo poucos minutos antes de chegar no hospital. Um ambulante parou na frente de seu carro e começou a fazer malabarismo com limões. Como sempre ele recusou o serviço, não deu um centavo ao ambulante e ainda falou que com toda aquela saúde o jovem deveria estar trabalhando, não pedindo dinheiro. O jovem fingiu que ia passar para o carro de trás, parou na janela de Carlos e apontou o 38.
- Dá tio! Dá logo! Dá tudo!
Com uma única tacada Carlos perdeu um relógio caríssimo e um Iphone de ultima geração. O jovem fugiu correndo e desapareceu em uma viela próxima a estação de trem. O ódio tomou o coração do doutor e ele amaldiçoou até as futuras gerações do jovem infrator.
O Dr. Carlos entrou no hospital as 08:25 da manhã com passos pesados, vermelho de raiva e revoltado. Não cumprimentou ninguém e foi direto para sua sala. Passou o dia inteiro tratando os funcionário mal e atendendo todas as ocorrências de má vontade.
Era quase meia noite quando a luz vermelha piscou e a voz feminina do alto falante o convocou para a sala de emergência. Carlos pôs o jaleco rapidamente e foi até.
- O que houve? - Perguntou sem interesse para uma enfermeira desesperada.
- Um jovem baleado.
A mente de Carlos imaginou o jovem que lhe assaltou e ele sorriu com prazer. A enfermeira estranhou aquela reação e o levou até o jovem ferido. Não era o rapaz que havia lhe assaltado e o dr. Carlos soltou um muxoxo. O jovem estava lucido e o tiro na verdade havia lhe acertado de raspão no ombro. O dr. Carlos tratou do jovem e voltou algumas horas depois para sua sala.
Carlos não parava de pensar no jovem que o assaltou. Sua imaginação só criava imagens de morte, sofrimento e dor para o jovem infrator. O dr. atendeu mais algumas ocorrências e aguardou ansiosamente pelo fim de seu plantão de 24 horas.
Quando deu 08:15 da manhã, Carlos arrumou suas coisas e se preparou para ir embora. Faltavam só 15 minutos para a glória e ele estava ansioso para comprar um novo Iphone. Carlos saiu de sua sala, conversou com alguns funcionários só para matar o tempo e foi para a maquina de ponto. Faltava 3 minutos.
Carlos esperou ao lado da maquina prontinho para bater o ponto e sair de lá. De repente a voz feminina ecoou no alto falante o chamando na sala de emergência. O doutor bufou, reclamou para o teto e foi até lá se arrastando.
Ao entrar na sala viu um grupo de enfermeiros em volta de um jovem que sangrava abundantemente pela barriga. O dr. Carlos olhou para a face do jovem e não teve duvida, era o meliante que lhe assaltou. O médico ficou estático tentando controlar a raiva e tendo uma enxurrada de imaginações macabras.
- O que houve?
A enfermeira suja de sangue o olhou desesperada.
- Ele foi assaltar uma pessoa que reagiu e o esfaqueou. Acho que a faca atingiu um órgão! - Gritou ela para o doutor sorridente. - Ele precisa de uma cirurgia urgente!
- É mesmo? Pena que eu já estou indo embora. Já deu o fim do meu plantão.
A enfermeira arregalou os olhos.
- Mas... Doutor... Não tem outro médico aqui, só o senhor. Se ele não for operado agora vai acabar morrendo!
- Que pena. - Ele entornou a boca fingindo tristeza. - A justiça de Deus não falha. Eis a hora em que a caça vira caçador.
A enfermeira respirou fundo.
- O Deus que eu sigo e que me salvou jamais teria esse tipo de justiça. Ele enxerga a todos como uma alma!
A enfermeira correu até o jovem. O doutor Carlos deu as costas para o grupo desesperado de enfermeiros e saiu pela porta. Com o queixo erguido caminhou até a maquina de ponto e encostou seu dedo no local indicado. A folhinha saiu, ele puxou o comprovante e caminhou sorridente para a porta.
Antes de entrar no carro, Carlos pegou o vidrinho de óleo ungido, fez uma oração e pingou algumas gotas sobre ele e sobre o carro. Entrou, sentou atrás do volante e abriu um sorriso satisfatório. Girou a chave na ignição e o rádio ligou. Estranhamente o rádio não foi direto para o MP3 e ligou em uma estação. Era a rádio gospel que ele não ouvia há anos. O pastor gritava:
- ... Lembra irmão de onde Jesus te tirou? Lembra de tudo que ele te deu? Lembra de tudo que ele te fez? Lembra do que você era e o que se tornou graças a vontade dele? Que isso irmão!? Agora você quer dar as costas? Agora você quer desobedecer? Agora você age com ingratidão? Não irmão! Não mesmo! Olhe-se no espelho, faça uma auto avaliação e diga que Cristão você é! Será que você está certo?
As palavras atingiram Carlos em cheio e ele se olhou no retrovisor. Pensou rapidamente em seu dia e na vida daquele jovem lá dentro. Fez uma rápida avaliação de sua vida e chorou. Lá dentro do hospital estava a chance de fazer algo para Deus.
Carlos lembrou de sua experiência com Jesus, quando em 2004 sofreu um acidente de moto e uma bactéria quase o levou a morte. Na epoca Carlos era promiscuo, blasfemador e extremamente incrédulo. Entre a vida e a morte teve o perdão de Deus e a chance de fazer tudo diferente. Jurou trabalhar na obra de Deus, mudar seu jeito de ser, suas ações e a salvar almas para Deus.
Todo mundo estranhou quando o doutor entrou correndo no hospital e atravessou o corredor as pressas. Os enfermeiros ainda brigavam para estancar o sangue e salvar a vida do jovem meliante que agonizava. O dr. Carlos entrou na sala de emergência como Jesus entrou em sua vida, sendo a ultima esperança daquele jovem.