O Bar
Luz velada e uma porta estranha com o arco superior guarnecido de vidros grossos. A porteira mirou-o dos pés à cabeça, perguntou se vinha só e, num gesto fatigado, indicou-lhe o corredor escuro que levava a uma sala acanhada com pouca luz. Um balcão com bancos altos, meia dúzia de mesas, uma música nostálgica e o sussurro, que parecia vir do chão, diziam da presença de mais gente que só viu depois, quando, afeitos à pouca luz, os seu olhos perceberam a totalidade do espaço. Sentiu os olhares todos sobre si, encolheu os ombros, sentou-se ao balcão e pediu a bebida gelada. Fixou a atenção no pedaço de gelo, mexeu-lhe com os dedos, lambeu o líquido que escorria para a palma da mão e foi sentindo que o Bar enchia, a música se animava, que as pessoas ficavam de pé a gozar nos corpos adjacentes, a falta de espaço. A mistura de suor e perfume ombreava com o ruído forte, palavras que se perdiam sem chegar ao destino. As mãos a roçarem outras, as coxas firmes, a roupa casual. Iam e vinham em grupos barulhentos. O som do exaustor, o equilíbrio do empregado com a bandeja de bebidas, a falta de troco, o ganho espúrio. Depois, a memória que queria apagar voltou e com ela os diálogos mais fortes, a dor no peito, o engolir da bebida, de outra e mais outra. Pagava tudo adiantado. Quando por fim as lágrimas correram pela face barbuda e o nariz foi, por falta de lenço, limpo ao guardanapo de pano, tentou sair e caiu. Arrastaram-no para fora, sentaram-no no chão encostado à parede cor-de-rosa e o ar frio daquela noite atenuou o efeito do álcool. Vomitou. A seguir, arrastou-se até ao carro, apoiou a cabeça no volante e adormeceu.