_________Acerto de Contas


Numa mesa ao canto da confeitaria, enquanto esperava pelo café, Corali contemplou mais uma vez a foto já desgastada pelos anos: em meio aos álamos, a casa se erguia majestosa, com seu telhado branco e suas vidraças antigas; ligando os jardins, a pequena ponte — que Viriato pintara de azul: "Em homenagem aos seus olhos", ele dissera. Ali, ela vivera os melhores anos de sua vida... Um nó na garganta a sufocou. Depois de vinte anos, as lembranças ainda lhe causavam a mesma dor daquele distante 13 de dezembro de 1991.

Corali se recompôs, fez uma ligação. Do outro lado, uma voz feminina: “Alô, Nora falando!”. Desligou de imediato. Seria mais fácil que imaginara: a mulher que lhe roubara  o marido, continuava viva e atuante em seu posto de dona da casa. Saboreou o café, contemplando a fumaça  a evolar-se no ar. Era chegada a hora tão aguardada. Chamou um táxi, deu o endereço.

Enquanto o carro rodava, Corali calculava o tempo restante para adentrar os portões da mansão: cada segundo valia os duros anos de reclusão pacientemente cumpridos. Nora não a esperava. Não sabia da redução de pena, da volta antecipada — muito menos que a Casa da Ponte Azul seria mais uma vez palco legítimo do acerto de contas que ficara pela metade. Sentiu o volume da arma na bolsa: naquela mesma tarde, Viriato teria novamente a companhia da amante.