A LUA E ELA (BVIW)
Em certo abril, numa festa religiosa, Anabel conheceu Rodolfo. Ela cantava no coral da igreja, ele vindo de mudança para a cidade, apresentara-se às artes do violino, cujas cordas — ainda mudas pelo luto de Paulinho, que se fora há dois meses — esperavam pelos acordes de novo dono. Olhares trocados, Anabel e Rodolfo se entenderam de imediato. E toda vez que o soprano dela ecoava no Aleluia, os dedos dele tremiam emocionados nas notas do acompanhamento: estava feito o dueto que levaria os fiéis aos mais delirantes fervores da fé.
Rodolfo era praticamente o céu. Uma educação finíssima, uma gentileza recorrente, uma grandeza de gestos e doçuras, que encantariam qualquer mulher. E se fosse carente, então... Seria o céu acrescido de fulgores, com incontáveis números de estrelas — por serem estas conjunto infinito — e mais umas dez luas, que uma só era pouco pra tanto brilho, mansidão e serenidade. Ela não economizou no amor. Deitou nos braços daquele luar e se entregou completa, inteira aos devaneios de amar. Era feliz.
Pelos meados do Natal, chegou ao coral o tom rouco e absoluto de Maria Otília, num espetáculo gratuito de contralto e talento. A moça chegou mesmo pra encantar (e humilhar), fazendo sumir todas as vozes, tão potente era seu poder de absorver e refletir raios e focos. E o foco de Rodolfo desviou-se. Pousado sobre os lábios desenhados da morena, que iam muito além dos arabescos de qualquer partitura, os olhos do violinista mudaram de pouso, emudecendo o tom de certa soprano... E ela sofreu como nunca.
Sentada na sala de espera do terapeuta, Anabel pegou papel e lápis, rabiscava desenhos: os mesmos que rabiscava casualmente — certa vez ouvira um profissional explicando que a pessoa sempre desenha o que lhe dita o inconsciente — Ela não sabia explicar, mas desenhava sempre luas e estrelas... Ou corações flechados, daqueles atravessados de lado a outro por setas pontiagudas. Anabel pagava consulta, mas não precisava nenhum psicólogo para lhe dizer: aquilo era carência de ser amada, vontade de viver um grande amor. Um amor que, antes mesmo de crescer, tinha sido engolido pela lua.
Rodolfo era praticamente o céu. Uma educação finíssima, uma gentileza recorrente, uma grandeza de gestos e doçuras, que encantariam qualquer mulher. E se fosse carente, então... Seria o céu acrescido de fulgores, com incontáveis números de estrelas — por serem estas conjunto infinito — e mais umas dez luas, que uma só era pouco pra tanto brilho, mansidão e serenidade. Ela não economizou no amor. Deitou nos braços daquele luar e se entregou completa, inteira aos devaneios de amar. Era feliz.
Pelos meados do Natal, chegou ao coral o tom rouco e absoluto de Maria Otília, num espetáculo gratuito de contralto e talento. A moça chegou mesmo pra encantar (e humilhar), fazendo sumir todas as vozes, tão potente era seu poder de absorver e refletir raios e focos. E o foco de Rodolfo desviou-se. Pousado sobre os lábios desenhados da morena, que iam muito além dos arabescos de qualquer partitura, os olhos do violinista mudaram de pouso, emudecendo o tom de certa soprano... E ela sofreu como nunca.
Sentada na sala de espera do terapeuta, Anabel pegou papel e lápis, rabiscava desenhos: os mesmos que rabiscava casualmente — certa vez ouvira um profissional explicando que a pessoa sempre desenha o que lhe dita o inconsciente — Ela não sabia explicar, mas desenhava sempre luas e estrelas... Ou corações flechados, daqueles atravessados de lado a outro por setas pontiagudas. Anabel pagava consulta, mas não precisava nenhum psicólogo para lhe dizer: aquilo era carência de ser amada, vontade de viver um grande amor. Um amor que, antes mesmo de crescer, tinha sido engolido pela lua.