Trabalharam apenas meio expediente, num ‘meio’ feriado...  (Marmitas em casa.)  Aí, um grupo escolheu almoçarem num lugar bom.  Rio de Janeiro, escritório de empresa sueca perto do centro da cidade, sugestão de famosa churrascaria em Laranjeiras, zona sul.  Kombi de carregar mercadorias.  Acontece que muito gente por certo de outras empresas se inspirou igual e o restaurante estava lotado.  Não sabiam, mas o prato semanal daquele dia era... feijoada, uma das comidas prediletas do verdadeiro carioca.  Dispensaram a carne.
          Grupo de dez pessoas, juntaram pequenas mesas, comprido papelão do restaurante, toalhona.  Vieram pratos, talheres, copinhos com o tradicional aperitivo, copos ainda vazios.
          Garçom avisou:  “...mas é feijoada paulista”.
          O pai viajara muito a trabalho para a “Pauliceia Desvairada”  (MÁRIO DE ANDRADE apelidou:  culpa não é minha, ta?), ELA ainda garota,  depois trazia ‘exemplares’ e em casa fazia relatório das refeições.  Exibia-se para as amigas, cujos pais nunca viajavam nem para cidades próximas, como se São Paulo fosse assim do outro lado do mundo:  “Rúcula!”  Ninguém sabia do que se tratava.  “Meu pai trouxe pasta  (nunca dizia macarrão) comprada fresquinha das senhoras que ficam de avental nas portas das casas, lá no Bi (um “i” bem acentuado...) xiga.”  As outras nunca tinham ouvido falar...  Esnobava nada discreta.  “E tem um café fininho como pó-de-arroz que passa pelo coador de pano.”
          (Só muitos anos depois ELA soube do livro “Brás, Bexiga e Barra Funda”, contos regionalistas de ALCÂNTARA MACHADO, muito do modo de falar do imigrante italiano.  O tal café, em pacotes comerciais de meio quilo, um tanto caro e bem fora do gosto carioca, era vendido somente no Café Thalia, um bar de esquina perto de alguns teatros, Praça Tiradentes, também no centro do Rio  -  mãe passou a comprar, de raro em raro, a filha enjoaaada pedindo.  Só muitos anos depois ELA, por conta própria e praticidade de tempo menor, passou a usar café solúvel:  indústria mineira.)
          Ora, ambiente cheio ali e possivelmente em outros lugares.  Tempo chuvoso, algum friozinho, pelo menos já estavam acomodados.  Foi o que ELA pensou.  Adiantou-se a todos.  “Sim, pode trazer...”
          A comida chegou num carrinho com prateleiras – dez potes de barro brilhoso com a feijoada de feijão preto, aparentemente completa, uma grande terrina com arroz branco, outra com couve cortada fininha e refogada, outra com farofa, dez laranjas cortadas em quatro partes.  Na maior alegria, despejaram a feijoada no prato e...  “Só isto?  Cadê os outros salgados?”  Só isto mesmo.........  Feijão preto e ‘um máximo’ de quatro complementos – salgados a carne seca e o lombo, defumada a lingüiça ou o paio, ao natural a “tripa” (na verdade, bucho, estômago do boi).  Ah,que cor preta linda!  E que cheiro!  Cadê orelha, pezinho, rabinho de porco???  ELA explicou que nunca fora à capital paulista e imaginava que os viajadíssimos soubessem do que se tratava.
          À saída, alguém leu no fundo dos copinhos de caipirinha, mistura de cachaça com suco de limão:  “Fui roubado da Churrascaria Tal (o escritor aqui não faz publicidade).”  O mesmo garçom piscou e autorizou levarem...
          Sim, poucos dias depois, chegaram certos diretores de Estocolmo, conheceram em outro local e apreciaram a feijoada completa, a secretária geral e as demais moças do escritório fizeram embalagens para despacharem de avião europeu.
          Laranja é universal?


                                                               F  I  M
         
 
 
 
 
Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 26/12/2020
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