329 - Metal
Com o seu carro de mão corria os contentores do lixo. Hoje recuperara as molas de um colchão, as grades de um fogão que já não estava, cavilhas arrancadas com custo às tábuas. Estava a ser um dia fraco. Parou para recuperar forças, limpar o suor do rosto, afrouxar os cardaços das sapatilhas e meter à boca um pedaço de pão com chouriço, merenda que ela preparara para o almoço. Além do pão e do enchido havia uma batata cozida com casca e um ovo, a garrafa de plástico com água que o sol tornara mole e quente. Viu a panela de pressão jogada noutro lugar. Ainda procurou a tampa mas o peso do metal achado alegrou-lhe a face. Decidiria depois se recuperava para seu uso, se a venderia ao ferro velho, se a dava com o restante material para ser pesado e vendido a peso. O cão ficava a olhá-lo enquanto se metia no lixo e seguia-o de perto durante o caminho. Já abocanhara parte do pão com chouriço e rejeitara a batata. A língua de fora e a cauda caída diziam da sede do animal. Deu-lhe a beber da caneca de alumínio e seguiram ambos sob as árvores para o campo onde Fernando tinha um depósito. Deitados os dois na lona esburacada, dormiram a sesta. Quando o cão ladrou, o homem levantou a pala do boné e viu gente das obras, à má fila, largar ali entulho, verguinhas de ferro e aço, um balde com fio-de-prumo e uma talocha, além de duas boas colheres de pedreiro que Fernando achou no meio da descarga. O dia, que tão mal começara, compunha-se assim. – Chega por hoje, Rex. E o cão, balançou a cauda sabendo do ritual de fim de jornada. - Ainda é cedo mas calha-me o corpo para a preguiça, disse, ajeitando a roupa para o regresso a casa.