A parcimônia é sempre boa conselheira mas, enfim... Naquele dia, fui trabalhar, já fazia mais de vinte e quatro horas sem dormir... passara o dia no leito de hospital ao lado de minha mãe doente. Tento sempre mentalmente me preparar para o pior... E, aquele balão de oxigênio, inflando e desinflando era torturante... O corredor frio todo pintado de branco, parecia uma linha imaginária a rumar para o infinito... Minha irmã chegou, rendeu-me no leito e, fui trabalhar...perguntou-me: -não vai trocar de roupa nem tomar banho? E, secamente respondi: se eu fizer tudo isso, não conseguirei ir trabalhar... Vou assim mesmo... E, fui. Assim que cheguei, a secretária Gilda, cumprimentou sorridente e falou: - Nossa, com o mesmo vestido!... A night foi boa, hein? Dei um sorriso amarelo. Parei, olhei fundo em seus olhos pintados e borrados e, disparei: -Sim, foi boa noite no leito do Pedro Ernesto, onde minha mãe está internada. Pronto, agora pode comunicar ao Maracanã inteiro, e por favor, não faça alarido! Gilda empalidecera. E, grasnou desculpas que ignorei peremptoriamente... Entrei na minha sala e fechei o trinco... queria respirar algum oxigênio que não fosse contaminado de fofoca. Francisco bateu na porta... Ele me chamava de "chefinha", e eu detestava... Abri o trinco... Disse: fala, doutor! E, Francisco atalhou... veja o que posso adiantar para você, soube que sua mãe internou... Agradeci. E, quando ele iria embora, questionou: você vai transferir a Gilda? Eu ri, só se for para o inferno... mas aqui no purgatório, já é suficiente.., Ademais, ela não merece promoção! É uma pena que algumas pessoas pequem publicamente, seja por falta de sensibilidade ou pudor. Poderiam fingir que tinham alguma lhanura. Alguma humanidade mesmo denegrida pelo rímel. Mas, parece que tem que haver sempre uma pedra no meio do caminho. Deixo-me contaminar com a poesia de Drummond. Eis que a pedra vira alavanca, e de repente, tudo fica superável. Perdoei a Gilda.
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