PORQUE NÃO HOJE?
Nestor estava andando em uma rua muito movimentada quando disse baixinho para si mesmo: "Às vezes sinto-me sozinho mesmo cercado de gente." Nesse momento, alguém ao lado dele respondeu: "Também eu." Nestor se assustou e continuou a ouvir:
"Também eu."
"Também eu."
"Também eu."
E aquela frase foi se repetindo como um eco,.pois todos se sentiam sozinhos também.
Então, Nestor teve uma ideia:
"Já que estamos todos sozinhos, que tal se nos juntarmos e nos comprometermos uns com os outros e olharmos uns para os outros e..."
Alguém ao lado dele respondeu:
' Sua ideia é boa, mas deixa que cada um cuide da sua própria vida. É melhor ficar sozinho. Envolvimento dá muito trabalho."
Uma nova onda de eco começou:
"É verdade."
"É verdade."
"É verdade.'
Quando se ouviu uma multidão em coro,.concordando:
"É verdade!!!"
Nestor, desapontado, perguntou:
"Então, as pessoas ficam sozinhas porque querem."
Alguém lhe respondeu:
' Não é bem assim. No fundo queremos que as pessoas se importem conosco, mas que não se tornem pesadas a nós. Queremos.ficar sozinhos, mas.sem as consequências da solidão.Queremos que nos abracem, mas não nos apertem. Como resultado,.ficamos cercados de pessoas e continuamos sozinhos"
Houve, então, um burburinho:
"Concordo"
" Eu também."
Não. Eu não concordo."
" Eu também não"
Começou um barulho que já não era como o eco de antes.
Era como uma cachoeira que se arrebenta em água quando chove na cabeceira, podia se ver que aquela multidão arrastava muita coisa com ela,. além da solidão.
Foi quando um voz se destacou de entre as outras:
" Nestor! Eu quero!
Nestor foi abrindo caminho até chegar àquela voz:
" O que que você quer?" Ele perguntou.
" Eu quero olhar pra você, me.comprometer com você"
Nestor abaixou- se e viu uma criança no meio daquela multidão:
" Mas você ainda é uma criança!" Disse ele admirado.
"Então, por isso mesmo. Quero crescer aprendendo a me comprometer e a olhar para as pessoas porque um dia não quiseram se comprometer comigo. Eu quero crescer enquanto aprendendo." Disse com a maior naturalidade.
Nestor ficou confuso olhando para aquela criança parada diante dele.
" E aí? Vai topar ou não vai? Vocês adultos pensam demais. Gastam muito tempo pensando e pouco tempo se envolvendo de verdade."
Nestor sacudiu a cabeça como se tivesse acordando e respondeu sorrindo:
" Vou sim. Já topei!
Tomando aquela criança pela mão, saíram ambos dali deixando a.multidão que os contemplava já emudecida.
" Papai, papai!" Foi a voz que Nestor ouvia longe até que acordou com os solavancos do pequeno Artur. Ele abriu os olhos, deixando de lado o livro que lia quando apagou no sofá da sala.
O menino o olhava saliente, com uns patins na mão:"Topa ou não topa? O senhor falou que ia me.ensinar andar de patins..."
"Mas tem que ser hoje, filho?" Perguntou Nestor.
"Por que não? Vocês adultos pensam demais." Respondeu Artur já demonstrando que ficou chateado.
Nestor meio que se reconectou com o sonho. Fez um cafuné na cabeça de Artur, bagunçando-lhe os cabelos: " Você está certo, por que não hoje? Nós adultos pensamos demais."
Levantou-se ele e pôs o pequeno Artur sobre os ombros e saiu disposto a olhar, a se envolver, a se comprometer e a ensinar o mesmo para o pequeno, enquanto ele crescia.
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