287 - Arroz de Cabidela
Se gritos houvesse ficavam abafados na sua mão quadrada e nenhum bater de asas acontecia sob o pé firme que as prendia. Da morte do frango um leve estertor e o fio grosso de sangue recolhido em copo com vinagre para a cabidela. A seguir, mergulhado na água a ferver e rapidamente depenado, a pele grossa das patas tirada, as pontas cortadas a golpe certeiro da mesma faca, a ave ficava pronta após o corte final para a retirada das tripas e das miudezas. Enquanto isso Arménio, limpando as unhas com o canivete, esperava que ela voltasse a subir os quatro degraus da escada de pedra e, no acto de pendurar na parede o alguidar, voltasse a mostrar as coxas grossas, penugentas, a zona escura de pelos fortes mais adivinhados que vistos. Fora assim que as coisas se passaram naqueles idos do começo. Ela, tosca e ingénua, simples e descuidada, ia mostrando os segredos sem pensar no efeito que causavam ao rapaz que viera para a vindima e descansava junto ao muro sem reboco no quintal. A seguir, e antes que ela sumisse para a cozinha, rodou na mão o boné e deu consigo a convidá-la para a romaria de S. Pedro. Iria cada um como calhasse e encontravam-se lá para dançar uma modinha, depois que devolvessem o santo ao seu altar. Admirada primeiro, curiosa depois e muito interessada no homem que agora via com olhos novos, ajeitou o lenço, limpou as mãos ao avental, sorriu-lhe e disse: - Combinado!