Em Tempos de Pandemia 16

Naquele último dizer, Elba, como que havia intuído da possibilidade de Tamara ter encontrado o Sagrado Em Si, o centro sem centro, que toda Alma merece experimentar.

Cadeirante ou bípede, doente ou gente sã, jovem ou velho, cristão, islâmico, budista, indiano, espírita, africano, católico. Antes de ter realizado a reza, feita a oração, recitado o mantra, feito a prática ritualística da profissão de fé que escolheu, antes ou depois da conversão pela qual iniciou-se na religião, no batismo de imersão que submeteu, seja aos doze ou depois, do pacto assumido, antes ou depois de nascer, quisera que tenha experimentado o amor caloroso divino no coração, que dispensa o rito, a prece, a rima do mantra, do jejum, da pureza da purificação, mesmo que para alguns, seja à partir destes.

Quando a Alma torna escolhida pela fonte Divina, que é Graça, faz a viagem, entra na morada de Deus, recebendo o dom da clarividência, do entendimento, do discernimento do porquê, para quê está na Terra.

O preconceito é dizimado, a busca, o esforço para ser recebido por Deus é extinto, a fragmentação escorre pelos poros, o Eu costurado no tempo para ser aceito por si mesmo e pelo outro não é encontrado mais, a Onipotência, a Onipresença, a Onisciência do Sagrado invade o Ser. Como Sol do meio dia, que cura toda incompletude.

Tamara havia, nos anos que sucederam ao infortúnio de ter sido vítima do acidente, tornando cadeirante, passou ser alvo de si mesma, lutou com o próprio ego, até exaurir todos os esforços na busca de soluções para a deficiência portada, a fé, a ciência, a força de vontade, e, ainda, o julgamento do outro, os mais variados caminhos da medicina para uma melhora. Os resultados, apesar de serem inestimáveis, foram pouco progresso.

Buscava ouvir as críticas, pela via da percepção consciente, livre de condicionamentos e julgamentos, as opiniões alheias, dos motivos de estar na cadeira nos anos, de não sair da condição. Falta de fé, outros, ausência de vontade pura de ficar boa, ainda, sina, covardia, até que outros, ausentaram do seu convívio porquê não aceitava-a na condição de cadeirante.

E os anos foram moendo as argumentações e os fracassos. Até passou não ficar triste mais olhar para a porta da sala, e não poder sair andando sem apoio; tentar levantar por várias vezes, e cair, provocando lesões por todo corpo; o sentimento de indignidade de não conseguir realizar as atividades corriqueiras de uma pessoa de sua idade.

O ego queria andar sobre as duas pernas como era antes, viver no natural do corpo, mas a intuição foi sinalizando que teria que arranjar outras possibilidades para ser no corpo sobre duas rodas sem perder a qualidade interna para ser na vida em estado de bem estar e adequação.

Tamara não tinha tempo mais para falar para a amiga que tinha passado ser inteira, Ela com tudo que a vida ofereceu. Tinha que partir, restava somente meia hora para estar embarcando para Suíça.

As dores, o sentir o peso do corpo e das pernas, não poder usar mais salto alto, tudo foi condicionando, subsumido à condição delineada como sendo ela, a Tamara formatada no colorido que foi dando a si mesma.

Quando assentou-se em Deus, passou entregar seu destino na vontade Dele. Deveria, indeclinavelmente, como meio de sobrevivência saudável da própria consciência, manter intacta a qualidade interna para estar na vida.

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 04/09/2020
Código do texto: T7054965
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